Relatos de ameaças e violência policial nas escolas de Goiás, ocupadas desde o fim do ano passado por estudantes secundaristas, tem surgido nas redes sociais na última semana.
No dia 14 de janeiro, a Justiça de Goiás determinou a reintegração de posse das escolas das cidades de Goiânia e Anápolis. Os estudantes alegam terem sido retirados dos estabelecimentos com violência pela polícia. Também dizem ter sido agredidos por pais de alunos e diretores das escolas. A maioria dos ocupantes tem entre 13 e 16 anos [1].
Os goianos protestam contra os planos do governo estadual de entregar a administração [2] das instituições à organizações privadas e à Polícia Militar [3]. No Brasil, várias escolas secundárias são administradas pelas forças armadas ou pela polícia, uma política criticada por educadores. Em setembro, o Comitê dos Direitos da Criança das Nações Unidas emitiu um relatório sobre o Brasil demonstrando preocupação diante da presença do setor privado e militar no sistema educacional básico do país.
Inspirados pelo movimento estudantil de São Paulo — que conseguiu a revogação de uma medida [4] que fecharia mais 90 escolas –, os secundaristas goianos passaram a ocupar suas escolas no fim do ano passado. No entanto, diferentemente da mobilização paulista, as ocupações de Goiás tem recebido pouca cobertura da imprensa nacional, com a repercussão se restringindo às redes sociais e à mídia local.
No dia 25 de janeiro, estudantes do Colégio Ismael Silva de Jesus, localizado em Goiânia, relataram que policiais pularam o muro da escola e agrediram os alunos ocupantes. Segundo a página no Facebook Secundaristas em Luta – GO [5]:
Nesse momento os alunos, ainda machucados, estão resistindo na porta da escola enquanto sofrem violência de pessoas da comunidade. Dois ocupantes foram ATROPELADOS na porta. E um dos estudantes que foi atropelado foi pro hospital com fratura exposta.
Apoiadora do movimento, a funcionária da Universidade Federal de Goiás (UFG) Mariana Barbosa, que chegou à escola minutos após o ocorrido, confirmou em seu Facebook [6] que os alunos foram agredidos e expulsos por policiais e alguns membros da comunidade local. Após a agressão, estes últimos passaram a anunciar, em um carro de som, que as matrículas no colégio para o ano letivo de 2016 estariam abertas.
Ela também denunciou ter sofrido ameaças por policiais enquanto levava os estudantes agredidos para o Ministério Público para que eles denunciassem o ocorrido:
Ao passarmos por uma rua um pouco mais afastada da escola e bem vazia, nossos carros foram fechados por mais três carros, sem nenhum tipo de identificação policial, nem nos veículos e muito menos uniformes ou distintivos nos policiais. Fecharam a gente, sairam de seus carros com arma na mão mandando a gente descer e colocar a mão na cabeça. Assim fizemos. Nos trataram com muita truculência. Gritaram com as crianças, não nos deixaram pegar nossos celulares para avisar o advogado, revistaram os carros, revistaram nossas bolsas, jogaram as cosias dxs meninxs no asfalto.
Um secundarista descreveu em vídeo a ação da polícia no colégio Ismael Silva de Jesus:
O Colégio Estadual Rui Barbosa, que havia sido ocupado dois dias antes, também foi alvo da polícia no dia 25. Alunos relatam na página Ocupação Rui Barbosa [7] terem sido expulsos do local com violência.
Já os estudantes do colégio Lyceu de Goiânia denunciaram [8] no dia 26 de janeiro o rompimento deliberado de um cano de gás da escola, numa tentativa de sabotagem da ocupação:
Hoje sentimos um cheiro muito forte e quando fomos procurar o problema encontramos o cano de gás do Lyceu serrado, vazando, NA IMINÊNCIA DE UMA EXPLOSÃO. O acesso é fácil pra quem está na rua, pularam e sabotaram o encanamento.
Ainda que estivéssemos cientes da violência direta ~que já começamos a sofrer~, ainda que soubéssemos que seríamos vítimas da opressão e da ditadura marconista, não esperávamos que algo tão sério pudesse acontecer contra o movimento.
Essa situação é muito séria, colocou em risco a vida e integridade física dos ocupantes.
Na noite do dia 26, estudantes protestaram na sede [9] da Secretaria de Educação de Goiás (SEDUCE) e alguns permanecem acampados no local. De acordo com a página Zé Ninguém [10], que vem postando vídeos e fotos das ocupações:
Após um dia de truculência, violência policial, reintegração de posse sem órdem judicial e chegar ao extremo de TENTATIVA DE ASSASSINATO. Estudantes, professores e apoiadores colocaram um basta no autoritarismo do governo, que privatizou o ensino público sem abrir nenhum canal de dialogo ou mesmo uma audiência pública.
O prédio da SEDUCE acabou de ser OCUPADO por dezenas de pessoas!
O professor Rafael Saddi afirmou em sua página pessoal [11] que ele e outros professores apoiadores do movimento estariam sendo perseguidos pela polícia civil por apoiar a luta dos estudantes:
Só queria dizer que o delegado que está chefiando a operação, que pretende me incriminar junto com outros professores e estudantes por organização criminosa, corrupção de menores, dano ao patrimônio público e furto (me incriminar por quebrar e furtar escolas, é mole?) é o mesmo delegado que chefiou a operação 2,80.
Esta Operação 2,80 foi a que prendeu os 03 estudantes da luta pelo transporte coletivo.
A página Secundaristas em Luta – GO ainda denunciou [12] que o Conselho Tutelar estaria telefonando para pais de alunos os ameaçando.
A Universidade Federal de Goiás (UFG) lançou nota de repúdio [13] à violência contra os estudantes. Pelas redes sociais, diversos ativistas tem prestado solidariedade.