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Vinte anos de paz em risco em Moçambique

Categorias: África Subsaariana, Moçambique, Guerra & Conflito, Mídia Cidadã, Primeira Mão
Nevoeiro matinal na Gorongosa. Foto de Bart Wursten no Flickr (CC BY-NC-SA 2.0) [1]

Nevoeiro matinal na Gorongosa. Foto de Bart Wursten no Flickr (CC BY-NC-SA 2.0)

Ontem, forças armadas moçambicanas lançaram um ataque contra a base onde se encontrava desde há um ano o líder da oposição e ex-líder guerrilheiro Afonso Dhlakama na Gorongosa, no centro do país. Após uma série de ataques atribuídos à Renamo contra as forças de segurança, alguns deles na estrada nacional, e uma série de negociações fracassadas em Maputo entre a Renamo e o governo, as forças armadas moçambicanas tinham basicamente cercado a base da Renamo durante as últimas semanas.

Após o ataque, no dia 21 de Outubro de 2013, um porta-voz da Renamo [2] declarou que se tratou de uma tentativa de assassinato contra Dhlakama, marcando o final do Acordo Geral de Paz, assinado há 20 anos [3], em 1992, em Roma. A Renamo anunciou que Dhlakama fugiu para o mato e notícias reportaram que ele terá dito que perdeu a capacidade de controlar a resposta dos seus apoiantes aos ataques do governo. 

A Renamo e o Estado de Moçambique (dirigido desde a independência pelo partido do governo, Frelimo) lutaram pelo país durante um período sangrento de guerra civil alimentada por políticas da Guerra Fria e rivalidades de longa data. Quando a Renamo deixou o mato, aceitou tornar-se partido da oposição e fazer parte de uma democracia “multi partidária”. O grupo nunca teve uma relação harmoniosa com o governo, e tentou levantar problemas em algumas das eleições, mas deixou-se estar no parlamento agindo como o principal partido da oposição.

Importante para contextualizar o conflito crescente deste ano é o facto de estarem previstas eleições autárquicas [4] [en] (boicotadas pela Renamo) e a contínua descoberta de grandes reservas de hidrocarbonetos na costa do Índico de Moçambique (conforme reportado pelo Global Voices [5]).

Comentários sobre a escalada das hostilidades não tardaram a aparecer, e muitos deles vieram de uma geração que cresceu depois da sangrenta guerra civil no país. No Twitter, muitos juntaram-se ao coro do “não” à guerra.

Rezem pelo meu país #Moçambique. Quem quer que seja que quer guerra, é bom que saiba que NÓS DIZEMOS NÃO à guerra. #Paz # Esperança

Comentaristas no mural de Facebook do jornal @Verdade observaram que o povo é que “paga o pato [13]” do conflito enquanto que os líderes parecem estar “bem relaxados [14]“.

Uma série de jovens referiram-se jocosamente a Dhlakama como o “Bin Laden” [15].

A conta não confirmada e aparentemente falsa de Afonso Dhlakama no Twitter divulgou “Estou vivo e num lugar seguro [16]“, provocando uma série de respostas sarcásticas e desrespeitosas. 

O blogueiro de longa data sobre Moçambique JPT escreveu [17]:

Olho o telefone, deixado em silêncio, e está cheio de mensagens, alarmadas, o temor da escalada… E a paz, esse bem supremo, está em perigo

A maioria mostrava-se extremamente preocupada com a incerteza sobre o que aí vem. Fransisco Moises comentou [18] no blog Moçambique para Todos:

Pelos vistos, o acordo de Roma morreu. Tudo é agora possivel. Tomar e quebrar uma base não é ganhar a guerra. Os que se encontram nas matas poderão agora lançar a guerrilha, principalmente sem o controlo do Dhlakama que era impedimento para muitos homens que queriam actuar.

Mas nem todos criticaram o ataque do governo. Num outro comentário no mesmo blog, Antonio Vasco escreveu [19]:

Era a hora!
Bases militares ou pro-militares da Renamo em Moçambique?
Mas,a Renamo nao é ela um Partido Político?
Se o desaparecimento do Líder da Renamo for permanente,talvez,talvez a Renamo como Partido Politico poderá ela transformar-se num verdadeiro partido político.
Boa Noticia! Se for necessário, que as forças de Segurança e militares de Moçambicanas que destruam todas palhotas dessa base. Boa, boa é boa notícia!

Enquanto isso, o Presidente Armando Guebuza continua com a sua digressão de “Presidência Aberta”, curiosamente na mesma província onde aconteceram os ataques a menos de um mês das eleições autárquicas marcadas para 20 de Novembro.