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Cartunista Latuff ameaçado de morte por criticar polícia militar

Categorias: América Latina, Brasil, Arte e Cultura, Ativismo Digital, Direitos Humanos, Liberdade de Expressão, Mídia Cidadã

Um comentário do cartunista Carlos Latuff [1], em seu Facebook, sobre o caso [2] recente do suposto assassinato de dois policiais militares por seu filho de 13 anos, suscitou reações imediatas nas redes sociais, incluindo ameaças de morte.

Conhecido por [3] “defender causas humanitárias através de suas charges de traços simples e humor ácido”, Latuff escreveu [4] em seu perfil do Facebook, na terça-feira, dia 6 de agosto:

Garoto mata seu pai, que era policial da ROTA…esse menino precisa de duas coisas: atendimento psicológico e uma medalha.

Ele faz menção ao principal suspeito do assassinato de quatro adultos da mesma família na Vila Brasilândia em São Paulo. O garoto de 12 anos terá cometido suicídio após o crime, no passado dia 5 de agosto. O Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa da Polícia Civil de São Paulo está investigando as circunstâncias polêmicas em que o caso tomou lugar. O pai do garoto era sargento da ROTA (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), a tropa de elite da Polícia Militar (PM) de São Paulo, conhecida por assassinar indiscriminadamente [5]e a mãe cabo da PM. A avó e a tia maternas da criança também foram encontradas mortas das imediações da casa da família.

Numa altura em que o debate sobre a desmilitarização [6] das polícias militares no Brasil se tem aprofundado, no seguimento dos protestos massivos [7] que tomaram as ruas do país no passado mês de junho, são frequentes as charges de Latuff criticando a ação da polícia.

Em postagem no Facebook [8] no dia 7 de agosto ele recebeu com naturalidade as ameaças que recebeu:

Ao longo dos meus 23 anos de profissão como cartunista já fui detido três vezes por desenhar contra a truculência da polícia brasileira, e já recebi inúmeras ameaças, seja de judeus sionistas por conta de minhas charges em favor dos palestinos, seja de extremistas muçulmanos pelas minhas charges sobre a questão egípcia e síria. Portanto, ameaças fazem parte do meu trabalho.

Mas agora, policiais militares e seus seguidores passaram a ameaçar o cartunista de morte pelas redes sociais e o próprio acredita que corre perigo.

Print de um dos perfis de policial militar que ameaçou Latuff no Facebook. [9]

Print de um dos perfis de policial militar que ameaçou Latuff no Facebook.

Elencando [10] uma série de comentários ameaçadores feitos contra Latuff, a Revista Fórum [11] colheu um depoimento do cartunista no qual ele afirma que a frase foi uma “provocação”:

Esse tema é tabu. Não podemos tratar da violência policial no Brasil. Vivemos em um Estado policial, e nesse Estado você não pode ser crítico, senão é ameaçado.

A arte engajada de Latuff denunciando os crimes da Polícia Militar/ROTA. Cartum de Carlos Latuff, uso livre [12]

A arte engajada de Latuff denunciando os crimes da Polícia Militar/ROTA. Cartum de Carlos Latuff, uso livre

No seu Facebook, a 6 de agosto, ele disse [13] não se sentir intimidado e reafirmou:

Quem conhece meu trabalho sobre a violência policial, sabe bem o que penso sobre a atuação das polícias no Brasil e lá fora. Sou coerente com o que acredito.

Ainda assim, no dia seguinte, o cartunista alertou [8] sobre o perigo real que corre, responsabilizando também o Estado brasileiro por qualquer coisa que venha a lhe acontecer:

Dessa vez, com as redes sociais, estas ameaças são potencializadas, graças a comunidades relacionadas a organizações policiais, que reúnem não só membros ativos das forças de repressão, como também simpatizantes com perfil fascista, anti-comunista, anti-petista, machista e homofóbico. É sabido que dois desses perfis, Fardados e Armados [14] e Rondas ostensivas tobias de aguiar “Rota” [15] estão incitando seus membros a tomarem ações violentas contra mim. E é bem possível que isso aconteça, afinal de contas, a polícia mata! Não seria eu o primeiro, e muito menos o último. Essa é a característica de nossas polícias, de nosso estado. E se acontecer, que sejam responsabilizados os administradores destas comunidades e o estado brasileiro.

Campanha pelo fim da Polícia Militar pegando carona nas ameaças feitas ao cartunista Carlos Latuff. Arte sobre cartum de Latuff, uso livre. [13]

Campanha pelo fim da Polícia Militar pegando carona nas ameaças feitas ao cartunista Carlos Latuff. Arte sobre cartum de Latuff, uso livre.

Diversas organizações demonstraram sua solidariedade, como o MTST [16] (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), as Mães de Maio [17] e o PSTU [18] (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado), que também selecionou [19] uma série de ameaças postadas em redes sociais contra o cartunista. Mensagens de apoio de indivíduos e de organizações sociais e políticas, inclusive [20] [en] do exterior [21] [sb], “lotaram a inbox [22]” do autor.

Diário Liberdade [23] republicou [24] a carta difundida por Latuff e manifestou seu apoio ao cartunista. O coletivo de comunicação Catarse [25] declarou [26] Latuff como “um artista e uma pessoa fundamental na defesa dos direitos humanos no Brasil, e também em muitos outros países, onde seu trabalho alcança e influencia”.