A denúncia de circulação de arroz impróprio para o consumo humano em São Tomé desde Maio de 2013 trouxe para as ruas o povo em protesto, e levou à retirada do produto do mercado por ordem do governo no início de Julho.
O descontentamento da população solidificou-se após circular nas redes sociais um Relatório Preliminar à qualidade do arroz que comprovava a visível infestação “com fungos, restos mortais de larvas e outros insectos”, conforme reportou o Centro de Investigação Agronômica e Tecnológica (CIAT), a 6 de Junho de 2013.
Ao todo 900 toneladas de arroz foram importadas dos Camarões pela firma D.S. Neves Limitada, propriedade do deputado e Secretário Geral do Partido Convergência Democrática, Delfim Neves. O negócio terá sido realizado com dinheiro público, por ajuste directo entre o governo de Gabriel Costa e o empresário político, custando ao Estado cerca de 2 milhões de dólares americanos.
O produto, habitualmente cedido pelo Japão ao governo a título de doação, devido ao acordo de cooperação existente entre os dois países, consta como um dos alimentos base e de maior consumo da sociedade santomense. No entanto, o preço praticado em momento de escassez faz com que este não abarque todos os bolsos. Terá sido a proximidade de ruptura de stock que levou à aquisição por parte de DS Neves com carácter de urgência, de forma a manter o mercado abastecido até à chegada de 3000 toneladas previstas para o mês de Junho.
“Não Queremos arroz podre“
O assunto tem sido amplamente discutido pelos internautas do país, particularmente no grupo “São Tomé e Príncipe ★ Téla Non ★” no Facebook, com maior audiência e influência no país. Um foto do arroz partilhada por Arlindo Santos no grupo despertou inúmeros comentários, como o de Nayr Santos que afirma:
É triste mas é verdade! Hoje tive a oportunidade de deparar com esta “qualidade” de arroz que esta a venda na nossa praça. Poderia não acreditar nesta foto, mas vi, infelizmente, de perto o arroz para o “povo” consumir… Digo o “povo” pra ser de uma forma super limitada, porque os que mandam chegar esse arroz cá na ilha pra ser consumido, de CERTEZA que não fará [sic] o uso do mesmo, estes e outros todos que têm as costas largam [sic]!
Lucas Lima, advogado santomense a residir em Portugal, após a leitura do relatório do CIAT comentou:
Em conversa com uma Mestranda em engenharia alimentar, coloquei-lhe a seguinte questão:
Com base neste relatório, o arroz objecto da análise pode ser consumido pela população?
Ela simplesmente respondeu-me que nem para animais se deve dar um arroz com essa qualidade. E disse mais, só não houve intoxicação alimentar porque o arroz é um produto seco ou seja, tem baixa quantidade de água.Por ultimo disse-me que este produto a nível de nutriente, já não tem, come-se para “encher a barriga” mas não alimenta.
A empresa responsável pela importação do produto, refutou num comunicado as acusações:
Quanto a qualidade do produto ora importado, gostaríamos de salientar que para além de visibilidade ocular de qualquer produto, faz-se fé nos Certificados de Qualidade e de Fitossanitário emitidos pelas entidades credíveis e vocacionadas para o efeito a nível internacional…
O acto de indignação não se limitou a comentários no Facebook, partindo também para uma manifestação pública no dia 26 de Junho com o lema “Não Queremos arroz podre”.
O protesto foi gravado em vídeo por Roberto Carlos e partilhado no Youtube:
Uma carta de Delfim Neves dirigida às autoridades camaronesas no início de Maio, e revelada por São Tomé e Princípe Indignados a 1 de Julho, terá alimentado ainda mais a impugnação do povo e consequentes manifestações de indignação.
No documento lê-se que com o intuito de obter isenção de impostos, Delfim Neves teria invocado factos que não correspondem à situação real e verdadeira do país. “Crise de Fome”, “População Faminta”, são algum dos termos utilizados afim de obter a condescendência das autoridades camaronesas.

Foto do protesto “Não queremos arroz podre” (26/06/2013), partilhada por Tito Cheque no Facebook (usada com permissão)
Paulo Gomes comentou:
Usar mesmo que indevidamente, o nome de um país (POVO) de forma fraudulenta em beneficio próprio pondo em causa futuras ajudas que os mesmos possam vir a necessitar já é de si só um ato de falta de caráter mas que ate se entende quando a ganancia assim dita. O que não se entende é quando se brinca com a saúde publica pondo em risco uma população por imperativos econômicos… acorda povo.
Perante os rumores e os escândalos, o Governo decidiu em conselho de ministros, no dia 23 de Junho, a suspensão temporária do produto até que os exames conclusivos sobre o mesmo, solicitados no exterior, chegassem ao país, já que os resultados patentes no relatório do Centro de Investigação Agronômica e Tecnológica (CIAT) foram considerados inconclusivos. Mesmo perante o despacho, o produto continuou a ser comercializado o que levou o governo através do Ministério do Comércio, Indústria e Turismo a determinar a recolha no mercado e a proibição da venda do produto.
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