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Brasil: Jovens caminham pela paz em Fortaleza

Categorias: América Latina, Brasil, Arte e Cultura, Direitos Humanos, Juventude, Mídia Cidadã, Protesto

Centenas de pessoas fizeram uma caminhada pela paz nas ruas do bairro Canindezinho, em Fortaleza, para denunciar os assassinatos de jovens, as práticas de extermínio e as fragilidades de infraestrutura na região de cinco bairros conhecida como Grande Bom Jardim.

Ao início da tarde de 18 de abril de 2013, a praça do Canindezinho foi tomada por jovens, estudantes, professores, lideranças comunitárias, artistas e apoiadores. Alguns chegaram mais cedo e confeccionaram seus cartazes ali mesmo, nos bancos da praça, e outros já traziam suas faixas: eles queriam falar sobre juventude, paz e vida. Alguns deles vestiam camisas com a foto de vizinhos e familiares assassinados, como forma de homenageá-los.

Uma faixa pergunta “Quantos jovens precisarão morrer para a sociedade e o estado tomarem uma atitude?”; outra faixa declara o “Manifesto da paz”. Foto de Icaro Martins, publicada no Facebook. [1]

Uma faixa pergunta “Quantos jovens precisarão morrer para a sociedade e o estado tomarem uma atitude?”; outra faixa declara o “Manifesto da paz”. Foto de Icaro Martins, publicada no Facebook.

A caminhada foi organizada pelo grupo Jovens Agentes de Paz [2] (JAP), um projeto do Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza [3], e contou com a parceria de escolas, associações comunitárias, organizações não-governamentais, e grupos artísticos e religiosos. Os organizadores estimam que 1.500 pessoas participaram na marcha.

Palavras que gritam pela vida

Caminhada da Paz do Grande Bom Jardim. Imagem compartilhada na página do Facebook do projeto Jovens Agentes de Paz. [4]

Caminhada da Paz do Grande Bom Jardim. Imagem da página do Facebook do projeto Jovens Agentes de Paz.

Segundo a carta aberta da caminhada, “Contra a violência de Estado e o extermínio anunciado: a gente grita pela vida!”, que pode ser lida online [5] no sítio do Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza, entre 2007 e 2010, no Grande Bom Jardim, 491 mortes tiveram conexão com a violência. Ainda segundo a carta, esse número inclui 186 jovens de 15 a 29 anos, mortos entre 2007 e 2009; só no ano de 2012, 166 pessoas foram assassinadas na região.

Para se fazer a comparação, segundo o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE [6]), os cinco bairros somam 204.281 pessoas, sendo 120.957 com idade entre 0 e 29 anos.

Em março de 2013, o jornal O Povo escreveu sobre a escalada de violência na cidade [7]: no mês de fevereiro, foram 142 pessoas assassinadas, das quais 15 foram nos bairros do Grande Bom Jardim. Nos 59 primeiros dias de 2013, o bairro Bom Jardim liderou as estatísticas policiais [8] com a apreensão de 22 armas de fogo – em 2012, o bairro ficou em 3º lugar na cidade, com 88 armas apreendidas.

Para os organizadores da caminhada, são várias lutas contra uma “cadeia de violações”, que inclui analfabetismo (a carta indica que mais de 9.611 crianças, adolescentes e jovens, entre 05 e 24, não são alfabetizados); doenças decorrentes de condições sanitárias e infraestruturais inadequadas; e o envolvimento de meninos e meninas na rota de exploração sexual.

A carta, que foi entregue aos presentes e às pessoas nas ruas, fazia uma crítica também ao debate em torno da redução da maioridade penal, que no Brasil está estabelecida em 18 anos:

Não bastasse esse cenário de horror, os jovens ainda têm que carregar a responsabilização da violência crescente no Brasil, em um processo de criminalização da juventude, que se articula com o consequente aumento do encarceramento de jovens e a batalha de setores reacionários pela redução da maioridade penal. Ou mesmo, têm que sofrer com a truculência de abordagens policiais diuturnamente, um tratamento igualmente prestado pelas emissoras que têm na sua programação os programas policiais, criminalizando pobres e estigmatizando bairros.

Banda de percussão toca na concentração da caminhada. Foto publicada no Facebook pelo perfil do coletivo Crítica Radical. [9]

Banda de percussão do projeto Luthieria Cultural toca na concentração da caminhada. Foto publicada no Facebook pelo perfil do coletivo Crítica Radical.

Um dos jovens participantes, Icaro Martins, acompanhou o evento de perto com uma câmera fotográfica. Ele criou um álbum de fotos no Facebook [10] para divulgar a caminhada.

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Cidadãos carregam a faixa “Juventude que ousa lutar vem com a gente caminhar – A juventude tem o direito de viver”. Foto publicada por Icaro Martins no Facebook.

A jovem Isabel Forte usou o Facebook [12] para apoiar a causa da caminhada:

Esse é o Bom Jardim que vale a pena!!! E estas pessoas que se importam com o bem estar coletivo são mais que valiosas!!! Força, pessoas do bem!!!

Cortejos pela paz

Em 16 de março de 2013, as crianças e os jovens do projeto Luthieria Cultural também participaram de um cortejo pela paz [13] no Parque São Vicente, uma área do bairro Canindezinho. Luthieria é uma “iniciativa artística, lúdica e educativa” que pretende “diminuir as situações de violência presentes no bairro” através da música percussiva e de processos formativos.

Pintura de muro durante cortejo: "Vamos unir nossas mãos pela paz". Foto publicada no blog Luthieria Cultural. [13]

Pintura de muro durante cortejo: “Vamos unir nossas mãos pela paz”. Foto publicada no blog Luthieria Cultural.

Participantes do projeto tocam percussão no Parque São Vicente, no bairro Canindezinho. Foto publicada no blog Luthieria Cultural. [13]

Participantes do projeto tocam percussão no Parque São Vicente, no bairro Canindezinho. Foto publicada no blog Luthieria Cultural.

Diversos projetos têm sido conduzidos nesses espaços, visando o enfrentamento da situação de violência entre os jovens no Grande Bom Jardim. Para o coordenador do projeto Luthieria [13], Jair Soares, as ações culturais são um caminho importante:

Nosso foco maior foi dizer que as ações culturais do bairro constituem-se como potencialidades frente as situações de desigualdade e violência enfrentadas nas periferias de Fortaleza.