Numa ação de censura às vozes que causam desconforto ao poder instituído em Angola, a Polícia Nacional confiscou, nos primeiros dias do mês de Março, uma série de trabalhos audiovisuais de activistas angolanos, entre os quais o novo DVD do rapper Brigadeiro 10 Pacotes, o DVD “sobre a vida e obra do histórico líder revolucionário Jonas Savimbi“, e CDs do músico Chingui Chinhama.
Em resposta, a produtora de Brigadeiro, Independente Universal Produções, juntamente com o Movimento Revolucionário, convocaram uma manifestação para o dia 7 de Março em Luanda, exigindo a devolução dos trabalhos confiscados na alfândega do aeroporto 4 de Fevereiro.
Principalmente através do Facebook, surgiam relatos do protesto que acabou por ser dissipado pela intervenção violenta da polícia.
Chegou a ser noticiada a existência de uma vítima mortal, embora tais declarações tenham depois vindo a ser desmentidas. Foi dado no entanto espaço àquilo que a Central Angola apelidou de “rumores especulativos” enquanto se procuravam “evidências sólidas” do paradeiro do “Mano Negro”, ou Negrão, o produtor de Brigadeiro.
Um dia depois do protesto, Pedrowski Teca procurou respostas na página de Facebook de Brigadeiro 10 Pacotes:
Ontem houve relatos de que o produtor do Brigadeiro Pacotes O Revolucionario, conhecido por Negrão, foi morto pela Polícia Nacional de Angola numa manifestação que visava exigir a devolução dos discos do Brigadeiro 10 Pacotes [outrora] apreendidos pelo regime.
Em notícias no Club-K, Hugo Kalumbo afirmou ter visto o mano a ser alvejado e as autoridades afirmaram que o Negrão foi simplesmente detido e entregue às Forças Armadas Angolanas (FAA) visto que supostamente por lei um militar não deve participar em manifestações.
Questões:
1 – O Negrão foi morto ou simplesmente detido?2 – Será que as FAAs podem apresentá-lo à público e explicarem, com base a lei, os crimes de que o Negrão é acusado?
Vários recordaram outros activistas também desaparecidos, Alves Kamulingue e Isaías Kassule, desde uma manifestação que tomou lugar em Luanda a 27 de Maio de 2012. Num comentário, Afonso Casimiro dizia:
se o “Caso” Kamulingue v Isaías Kassule, que já vai e dura e predura [sic] “já” quase ou aproximadamente “1 Ano”, desde que os mesmos (ambos) desapareceram nos Arredores ou algures e, nas Ruas desta Cidade Capital “Luanda”. Ainda e, até agora “Hoje”, não nos exclareceram-nos [sic] sobre o desaparecimento ou à suposta morte, do Kamulingue e Isaías Kassule; e, quanto mais Este recém-desaparecimento “ou acontecimento” do Produtor Musical Negrão??!!
Dois anos de luta
Exactamente dois anos antes do protesto pelos DVDs confiscados, a 7 de Março de 2011 era lançado o movimento de contestação contra o governo, sob o mote “32 [anos] é muito“, exigindo a saída de José Eduardo dos Santos do poder. Em Agosto de 2012 José Eduardo dos Santos foi reeleito para mais um mandato de cinco anos.
Numa entrevista à Deutsche Welle, em tom de balanço sobre os dois anos de activismo, Jang Nomada diz ter noção que “a missão é dura e das forças que existem para desligar as pessoas que estão a criar este tipo de mentalidade”, apontando o hip-hop como uma das actividades que têm sido perseguidas pelo sistema.
Não foi agora a primeira vez que trabalhos musicais de Brigadeiro 10 Pacotes foram censurados. Já em finais de 2011, o Ministério da Cultura tinha proibido a venda do seu álbum “Ditadura da Pedra”.
Brigadeiro 10 Pacotes – Estado da Nação