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Protestos indígenas e pregação online: panorama dos países de língua portuguesa em 2012

Categorias: África Subsaariana, América Latina, Europa Ocidental, Leste da Ásia, Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe, Timor Leste, Arte e Cultura, Ativismo Digital, Juventude, Língua, Mídia Cidadã, Mídia e Jornalismo, Política, Relações Internacionais

Todos os anos, na medida em que os últimos dias do calendário se aproximam, fazemos um panorama da mídia cidadã [1] com os destaques do que aconteceu [2] no mundo online na língua portuguesa.

A mídia tradicional falha com frequência em fornecer uma cobertura mais ampla e profunda das questões ambientais, sociais, culturais e políticas que ocorrem em qualquer um dos oito países lusófonos. Mas a mídia cidadã desta vasta região linguística, que se espalha por todo o globo terrestre, esteve presente para preencher algumas dessas lacunas e alimentar a opinião pública.

Esse tem sido o caso da cobertura sobre as políticas de desenvolvimento adotadas pelo governo brasileiro e as consequências que afetaram diretamente os ribeirinhos, quilombolas e comunidades indígenas situadas por todo o país, e particularmente na Amazônia. A construção da usina hidrelétrica de Belo Monte [3] no Rio Xingu talvez tenha se tornado uma das causas mais fortes em âmbito nacional e fora do país. Em outubro, Sany Kalapalo, uma jovem indígena e ativista do Xingu [4], contou-nos como ela usa a Internet como ferramenta para divulgar a cultura indígena e mobilizar pessoas em prol de sua campanha para proteger a região de Volta Grande do Xingu, no estado do Pará.

Em novembro, o Grito da Resistência Guarani Kaiowá [5] rapidamente se espalhou da vila de Pyelito Key/Mbarakay, na cidade de Iguatemi (Mato Grosso do Sul), para uma onda de protestos em solidariedade aos direitos indígenas por suas terras [6].

In November, the Cry of Resistance of the Guarani Kaiowá triggered a worldwide wave of protests in solidarity with the Indigenous Guarani-Kaiowá and their cause. [7]

Foto dos 5.000 crucifixos plantados em Brasília. Imagem tirada da página Itiban Comic Shop no Facebook

Ao longo do ano, uma série de artigos sobre imigração brasileira nos levou a jornadas que não embarcamos por meio da mídia de massa.

De uma blogueira “decasségui [8]” no Japão que escrevia para a comunidade brasileira logo após o terremoto [9], a uma imigrante síria de 93 anos [10] que vive no estado de São Paulo, passando pela história dos Brasilibaneses [11], ou brasileiros do Líbano, e outras histórias. A própria política imigratória do Brasil enfrenta novos desafios [12]. Em dezembro, associações de imigrantes em São Paulo organizaram uma manifestação exigindo mais direitos com respeito à legislação [13] do país. A imigração de brasileiros para fora do país também esteve sob debate, particularmente por meio de como as mulheres brasileiras são vistas no exterior [14], após pronunciamentos altamente criticados feitos pelo presidente da Ordem dos Advogados de Portugal no final do ano, alegando que o produto mais exportados pelo Brasil para Portugal são as prostitutas.

Para acalmar os ânimos que floresceram com o debate, e trazendo um pouco de música para o contexto, algo que os brasileiros exportaram este ano foi o sucesso do cantor Michel Teló, a canção “Ai, se eu te pego! [15]“, cujo vídeo oficial [16] no YouTube já foi visto incríveis 470 milhões de vezes. Apesar do sucesso mundial do Michel Teló não alcançar os números atingidos por Gangnam Style, sua música com certeza deu iníco a um fenômeno global de “Telobalização” no início do ano, com a apropriação da música em novas versões em dezenas de idiomas diferentes. “Ai, se eu te pego!” também recebeu críticas devido a qualidade discutível do trabalho de Teló, e se deveria, ou não, representar a cultura brasileira no exterior.

Sobre cultura e alfabetização, damos destaque à Bicicloteca, uma bicicleta com uma pequena biblioteca [17] e acesso à Internet por meio de energia solar para os moradores de rua da cidade de São Paulo, e uma competição de escrita criativa [18] com duração de 7 semanas promovida pelo jovem jornalista cabo-verdiano Odair Varela em seu blog.

Plataformas para participação cidadã

Iniciativas interessantes para participação cidadã que fazem uma ponte entre o mundo offline e online emergiram em Moçambique em 2012.

Up North, in Cabo Delgado, an "open terrace" hosts monthly public debates - which are transcribed live to Facebook - allowing for the discussion and dissemination of important issues such as the missing transparency in the extractive mega projects in the country. [19]

Na região norte de Moçambique, em Cabo Delgado, um “terraço aberto” abriga debates públicos mensais – que são transcritos ao vivo para o Facebook – permitindo que a discussão e desseminação de questões importantes como o desaparecimento da transparência nos megaprojetos extrativistas do país [20]. Foto por Terraço Aberto (Debate Público em Cabo Delgado) no Facebook

O Mural do Povo de Maputo [21], um autêntico “mural offline do Facebook” é, na verdade, o longo paredão externo do prédio do jornal @Verdade [22], e permite que qualquer cidadão expresse suas reclamações de maneira pública e aberta. As mensagens são posteriormente transcritas para os meios de comunicação utilizados pelo jornal @Verdade, como o jornal impresso, mas também em sua página no Facebook e no website.

Uma escola local de mergulho em Tofo, a Bitonga Divers [23], tem conscientizado as pessoas sobre a necessidade de defender a vida marinha contra a sobrepesca em uma das praias turísticas mais importantes de Moçambique.

Enquanto isso, na Guiné-Bissau, onde há um grande abismo de acesso à Internet, um projeto de inclusão digital chamado CENATIC (um artigo sobre o centro de computadores foi lançado no Rising Voices [24] em abril) infelizmente teve de fechar as portas por conta do alto custo para mantê-lo aberto. O CENATIC foi lançado por uma ONG local e tinha o objetivo de fornecer acesso à internet mais acessível e apoio para indivíduos e organizações interessadas em descobrir como uma conexão melhor pode melhorar o seu trabalho.

From Sao Tome and Principe, STP Radio (Somos Todos Primos / We Are All Cousins) [25]

Em dezembro, o Global Voices entrevistou a Rádio STP (Somos Todos Primos), de São Tomé e Príncipe, uma comunidade de rádio online que tem um papel importante em unir a diáspora [26].

O futuro espera

Na arena política, 2012 foi um ano de eleições presidenciais [27] e parlamentares [28] no Timor-Leste [29], eleições municipais [30] no Brasil, e eleições locais [31] em Cabo Verde. Em Angola, Eduardo dos Santos foi re-eleito após 33 anos no poder. O caminho de desenvolvimento complexo deste país por meio das lentes da mídia cidadã está resumido em um post separado [32] [en].

Próximo do final do mês de novembro [33], São Tomé e Príncipe mergulhou em uma crise política [34] e, em Guiné-Bissau, outro golpe militar [35] derrubou o governo em abril de 2012. Um artigo do mês de outubro [36] descreve:

Enquanto as instituições internacionais expressam sua “preocupação” e organizam reuniões, o povo de Guiné-Bissau tem poucos meios para expressar seus medos e frustrações.

Em Portugal, houve bastantes protestos e duas greves gerais contra as medidas de austeridade [37] em meio ao cenário da crise econômica na Europa [38] que gera condições de vida ainda mais severas para a população. A maioria participou da manifestação que aconteceu em setembro sob o mote “Que se Lixe a Troika, Queremos as Nossas Vidas [39]“.

Em meio à multiplicidade de usos convencionais das plataformas digitais para ativismo, um dos personagens mais curiosos e que despertou a nossa atenção no início do ano foi, de fato, um padre e escritor de 75 anos chamado Mário Pais de Oliveira [40]. Ele usa as redes sociais religiosamente para compartilhar seus pensamentos particulares [41] – e disruptivos – sobre os eventos da atualidade, possui centenas de vídeos no YouTube e milhares de amigos no Facebook. Terminamos esse panorama do ano com uma citação simples de uma de suas homilias subversivas [41]. A respeito do que quer que seja trazido por 2013:

Temos de inventar novas formas de transformar a sociedade