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Mobilização pela Manutenção do Português como Língua de Ensino na França

Categorias: América Latina, Europa Ocidental, Angola, Brasil, França, Portugal, Ativismo Digital, Educação, Língua, Mídia Cidadã

O português conta com aproximadamente 250 milhões de falantes e é a sexta língua mais falada do mundo. Há por volta de 2 milhões de lusófonos na França, principalmente imigrantes e filhos de imigrantes portugueses.

No dia 30 de agosto de 2012, Geneviève Fioraso, a ministra do Ensino Superior, deu uma entrevista ao Médiapart sobre a reestruturação necessária das universidades, na qual ela diz [1] [fr]:

Avoir du portugais dans toutes les universités, est-ce indispensable ? J’adore le portugais mais avoir une discipline rare dans toute les universités, ce n’est peut-être pas utile”.

Ter o português em todas as universidades é algo necessário? Eu adoro o português, mas ter uma disciplina rara em todas as universidades pode não ser útil.

Essa entrevista mexeu com a comunidade lusófona da França, e um apelo foi lançado no Facebook [2] [fr] pela Casa Amadis [3] [fr], uma associação lusófona de Montpellier para protestar contra a declaração da Ministra:

Il faut savoir que le portugais est la troisième langue européenne de communication, qu’il est parlé par plus d’habitants dans le monde que le français et que c’est la langue de l’un des pays du G20, le Brésil.(…) Défendre l’enseignement du portugais, de l’italien, de l’arabe… en France, c’est donc aussi contribuer à la défense de la francophonie.

É necessário saber que o português é a terceira [maior] língua europeia de comunicação, que é falada por mais pessoas em todo o mundo do que o francês e que é a língua de um dos países do G20, o Brasil. (…) Defender o ensino do português, do italiano, do árabe… na França, é também contribuir para a defesa da francofonia.

drapeaux du Portugal et de la France sur wikimédia commons- Domaine Publique [4]

Bandeiras de Portugal e da França no Wikimedia Commons – Domínio Público.

Esse apelo foi depois retomado pelo Lusojornal [5] [fr], um jornal das Comunidades lusófonas da França e da Bélgica. Alexandra Custódio, de Saint-Etienne, declara no número 94 que:

Les 2 millions de Français, les 60.000 entrepreneurs d’origine portugaise qui contribuent tous les jours à l’économie de notre pays et qui sont tout à fait bilingues portugais /français, étaient jusqu’à ce jour, un atout pour la France, une passerelle naturelle pour l’accès à ces marchés de langue portugaise, mais maintenant ils se sentent «ignorés» et sont révoltés.
Les entreprises en France recrutent chaque jour de très nombreux diplômés, commerciaux, ingénieurs, etc… parlant portugais. Il faut à la France des étudiants formés en langue portugaise. Savez vous que les étudiants sortant des Universités françaises, formés en langue portugaise, ont un taux d’emploi de plus de 90%?

Os 2 milhões de franceses, os 60 mil empresários de origem portuguesa que contribuem diariamente para a economia do nosso país e que são completamente bilíngues em português/francês, foram até o presente momento um trunfo para a França, uma ponte natural para o acesso a esses mercados de língua portuguesa, mas agora eles se sentem “ignorados” e estão revoltados.
As empresas na França recrutam todos os dias um grande número de graduados, gerentes de venda, engenheiros etc… que falam português. A França precisa de alunos formados em português. Vocês sabiam que os estudantes que saem das universidades francesas, formados em português, têm uma taxa de emprego de mais de 90%?

A França é o segundo maior parceiro do Brasil em termos de investigação científica e de inovação tecnológica, depois dos Estados Unidos. Muitas são as universidades brasileiras envolvidas em acordos de cooperação internacional com a França por meio de projetos de pesquisa, geralmente com o apoio de financiamentos bilaterais tais como CNPq-CNRS.

Cap Magellan – Le Portugal sans clichés [6] [fr] enfatiza a importância desses intercâmbios universitários.

Cet enseignement est réellement indispensable car de plus en plus les entreprises, mais aussi les laboratoires de recherche, les formations les plus diverses demandent à avoir des spécialistes capables de travailler avec le Brésil, l'Angola ou autre pays lusophone. La coopération universitaire franco-brésilienne a d'ailleurs le vent en poupe et le Brésil vient de créer  un très vaste programme de formation internationale de ses étudiants: Science sans frontières.

Este ensino é realmente indispensável, porque cada vez mais empresas, mas também laboratórios de pesquisa, das formações mais diversas, demandam por especialistas capazes de trabalhar com o Brasil, Angola e outros países lusófonos. A cooperação universitária franco-brasileira também está indo de vento em popa, já que o Brasil acabou de criar um amplo programa de formação internacional para os seus estudantes: o Ciência sem Fronteiras.

O blog Correspondances Transatlantiques [7] [pt: blog Correspondências Transatlânticas], em uma carta endereçada à Ministra, sublinha [7]:

la vivacité de l’intérêt des Brésiliens pour la création littéraire, artistique et cinématographique française (le Brésil est aussi le plus grand marché en Amérique du Sud pour la littérature française).

a vivacidade do interesse dos brasileiros pela criação literária, artística e cinematográfica francesa (o Brasil é também o maior mercado da América do Sul para a literatura francesa).

e lembra [7] [fr] das questões econômicas e culturais da aprendizagem do português na França:

Outre le fait que de nombreuses industries des secteurs-clé de l’économie brésilienne sont françaises (exploitation pétrolière notamment), les prochains événements de portée mondiale au Brésil (Jeux Olympiques, Coupe du Monde de Football) devraient renforcer l'attractivité que le Brésil va exercer pour les entreprises françaises. Ces événements devraient ainsi offrir de nouvelles opportunités commerciales dans les domaines du BTP, transports, ingénierie environnementale et énergies renouvelables.

Além do fato de que muitas indústrias de setores-chave da economia brasileira são francesas (exploração de petróleo, particularmente), os próximos eventos de porte mundial no Brasil (Jogos Olímpicos, Copa do Mundo de Futebol) devem aumentar a atratividade que o Brasil vai exercer sobre as empresas francesas. Esses eventos devem, portanto, oferecer novas oportunidades de negócios nas áreas de construção, transportes, engenharia ambiental e energias renováveis.

Paulo Pisco, deputado dos portugueses do estrangeiro na Assembleia da República de Portugal, responde [8] em francês e em português à Ministra, em um artigo publicado no Médiapart:

A Senhora Ministra poderia ter pensado no profundo legado cultural português que vai do Japão ao Canadá, do Sri Lanka ao Uruguai. Poderia ter pensado na crescente importância da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), que tem 12 países de todas as partes do globo que querem ser membros associados, entre eles destaque para a Indonésia, Venezuela ou Marrocos. O Senegal ou as Maurícias, por exemplo, já são membros associados.

Laeticia Trigo, que participou do apelo lançado no Facebook [9] [fr] recebeu a seguinte resposta da ministra, que autorizou a publicação da carta:

Je suis bien désolée de ce malentendu. (…). Mon message, insuffisamment retraduit (peut être n'avais je pas été assez claire avec la journaliste) était le suivant : dans un contexte où les universités connaissent des situations financières de plus en plus préoccupantes depuis le passage à l'autonomie (mal) effectué des universités suite à la loi Pécresse de 2007, il faut organiser une offre de formation en réseau et mutualisée. Il se trouve que je venais de recevoir deux universités qui avaient une offre de formation au portugais pour 4 étudiants dans un cas et 3 dans l'autre. J'assume le fait de dire que nous ne pouvons plus financièrement assurer ce type de formation. (…). Bien entendu, cela suppose une aide à la mobilité des étudiants pour ne pas pénaliser une discipline, en l'occurrence une langue pratiquée de plus par une communauté très présente sur notre territoire. (…).

Eu sinto muito por este mal entendido. (…). Minha mensagem, inadequadamente retraduzida (talvez eu não tenha sido bastante clara com a jornalista) foi a seguinte: em um contexto em que as universidades enfrentam situações financeiras cada vez mais preocupantes desde a transição para a autonomia (mal) efetuada das universidades seguindo a lei Pécresse de 2007, é necessário organizar uma oferta de formação em rede e em conjunto. Acontece que eu havia recebido duas universidades que tinham uma oferta de formação em português para 4 estudantes em um caso e 3 em outro. Assumo o fato de que não podemos mais sustentar financeiramente este tipo de formação. (…). É claro, isso requer uma ajuda à mobilidade dos estudantes para não penalizar uma disciplina tal como ocorre com uma língua utilizada por uma comunidade com grande presença em nosso território. (…).