Este artigo faz parte da nossa cobertura especial Dossiê Belo Monte [1].
Nesta entrevista, dividida em duas partes, vamos conhecer Sany Kalapalo, jovem ativista indígena do Alto Xingu, do Mato Grosso, que com apenas 22 anos é uma das articuladoras da mobilização contra a usina hidrelétrica de Belo Monte, que está sendo construída na região da Volta Grande do Xingu, no Pará.
Identificada no seu blog [2] como “a filha do rio Xingu, de etnia Kalapalo e Aweti, do dialeto Karib”, “ativista indígena”, “filha do Pajé Kunue”, Sany é uma estudante prestes a tentar vestibular em São Paulo e também professora de cultura indígena xinguana.
Quem é e o que faz Sany Kalapalo?
Sou Sany, indígena do Alto Xingu, no Mato Grosso. Kalapalo por parte da etnia do meu pai e Aweti por parte da etnia da minha mãe, por isso meu nome completo é Sany Aweti Kalapalo, mais conhecida como Sany Kalapalo. Moro na cidade juntamente com uma parte da minha família, e estamos fazendo intercâmbio cultural. Nas férias sempre vamos para o Xingu visitar todos os parentes. Sou estudante e ativista em prol do meio ambiente e povos indígenas.
Como se envolveu na luta de Belo Monte?
Em março de 2011 eu e a minha amiga e parceira de luta Miryám Hess organizamos o primeiro protesto contra a Usina de Belo Monte em São Paulo. Foi um fracasso, só compareceram 12 pessoas, e depois organizamos com muito mais divulgação nas ruas e pela internet, aí conseguimos bom público na maior cidade do Brasil. Também para divulgar mais, quebrei o medo da câmera e fui a algumas TVs online, como JustTV [3], TV Orkut [4], e algumas entrevistas nas ruas. Daí por diante participei de vários encontros ambientais, como o Rio+20 também.
Atualmente, o seu contato com os povos do Xingu e o acompanhamento da construção da usina tem sido à distância, ou você tem história de vida e presença no local?
Já faz 9 anos que eu e a minha família moramos aqui [em São Paulo]. Na verdade alguns dos meus irmãos chegaram há pouco tempo, e não ficamos direto na cidade. Nas férias vamos ao Xingu para visitar os parentes e a nossa mãe. Meu contato com o meu povo às vezes é pessoalmente quando eu vou para lá, via telefone, via internet. Sempre tento estar por dentro de tudo que está acontecendo por lá. Tiro informações através das lideranças locais, até porque o Xingu é muito grande, dividido em três partes: Alto Xingu, Médio Xingu e Baixo Xingu.
A mobilização contra a usina tomou as ruas em algumas cidades do Brasil e teve bastante expressão na internet. De que forma o uso das redes sociais e de ferramentas virtuais contribuíram para potencializar a mobilização?
A internet tem sido uma ferramenta superimportante para mobilizar as pessoas, já que as grandes mídias ignoram e manipulam as informações vindas dessa construção Monstruosa!
Por exemplo, em fevereiro de 2011 eu criei minha conta no Facebook voltada para o ativismo contra Belo Monte. Em três meses já estava com cinco mil pessoas na minha página por causa das postagens pesadas e reais que falavam sobre Belo Monte. Muitos que não conheciam a respeito dessa mega Usina passaram a conhecer, e muitos deles se tornaram ativistas em defesa do Xingu. E juntos começamos a fazer grandes manifestações.
Ao longo de 2011, você criou conta no Twitter (@sanykalapalo) e um blog pessoal [2], e em 2012 um canal no Youtube [6]. Como você utiliza e se apropria dessas páginas?
Já estou com Twitter desde o ano passado, só que nunca entrava antes, até porque não sabia mexer direito e agora tô aprendendo aos poucos. rsrs. O blog também criei ano passado e não entro muito nele devido a falta de tempo, já no Facebook entro todos dias. Acredito que as redes sociais ajudam bastante para divulgar qualquer coisa e estão me ajudando muito a divulgar a cultura indígena e a minha luta.
Logo na capa de seu blog, você se descreve como “amada por uns, odiada por outros”, e isso intriga um pouco. A que você se refere nessa passagem? O que afeta a sua reputação?
“Amada por uns, odiada por outros”. É, coloquei assim, porque vejo que tem pessoas que gostam de mim, acompanham meu ativismo, e tem pessoas que se incomodam comigo e me xingam e até hackearam algumas contas que eu tinha nas redes sociais. Às vezes recebo ameaças pelas redes, mas não me incomodo muito com isso e continuo lutando.
Você é uma indígena jovem, mas bastante atuante, tendo inclusive criado o Movimento Indígenas em Ação, que tem página na internet [7]. Outros jovens indígenas também têm usado a internet como plataforma de expressão e de luta?
Faço alguma coisa pelo meu povo e pelo meio ambiente de coração. Escolhi seguir os passos do meu vô, que foi um grande guerreiro xinguano. Ele foi um guerreiro da Paz e tenho muito orgulho de ser neta dele. Criei o Movimento Indígenas em Ação em março de 2011 com o intuito de dizer para todos que índio não é do passado, que ainda existimos e queremos nossos direitos respeitados. Também criei a campanha Orgulho Indígena e recebi alguns prêmios por isso. Atualmente sou presidente-fundadora do Movimento Indígenas em Ação e logo teremos um escritório aqui em São Paulo. Vi que inspirei alguns jovens indígenas. Eles mesmos chegaram e me falaram isso. Acho isso muito bom, cada vez mais jovens indígenas estão participando da política voltada aos nossos direitos.
Após ter começado alguns cursos universitários, Sany decidiu tentar o curso de Letras no vestibular da Universidade de São Paulo. Ela pretende ser escritora para levar a cultura indígena para outras audiências. Em outubro, vamos publicar a segunda parte da entrevista, em que Sany fala de usinas hidrelétricas, desenvolvimento, povos indígenas e internet.
Este artigo faz parte da nossa cobertura especial Dossiê Belo Monte [1].