Esta postagem é parte de uma série de artigos da colaboração do Global Voices com Map Kibera e Map Mathare [en] que ocorreu durante a Cúpula do Global Voices em Nairóbi [en] em Julho de 2012.
Escrito, pesquisado e fotografado por Ylenia Gostoli, Saffah Faroog e Yvonne Tiany
Como parte de uma parceria entre o Global Voices e a organização local Aliança Map Kibera durante a quinta Cúpula do Global Voices em Nairóbi, no Quênia, um pequeno grupo de blogueiros do Global Voices e ativistas viajou a Mathare, um dos assentamentos informais nos arredores da cidade, para encontrar jornalistas cidadãos do Projeto Map Mathare [en]. O projeto, originalmente criado em Kibera em 2009, foi implantado em Mathare um ano depois.
Graças ao trabalho dedicado de moradores, Map Mathare pôde criar o primeiro mapa aberto da favela. Assentamentos informais como esse costumavam aparecer como pontos vazios nos mapas oficiais. O projeto também desafia a visão tradicional sobre favelas como lugares de crime e desamparo, pois os jovens cartógrafos e blogueiros que conhecemos trabalham com vídeo e escrevem no blog Voice of Mathare [en] (anteriormente chamado Mathare Valley Blog [en]) a respeito das questões que afetam sua própria comunidade. A organização, eles nos contaram, tenta manter o equilíbrio entre histórias positivas e negativas, e tem por objetivo mudar a percepção das pessoas sobre a vida no local, particularmente porque tanto a grande mídia local quanto a internacional apenas prestam atenção nas favelas durante tempos de crise e emergências humanitárias.
O ônibus nos deixou no limite de Mathare, localizado na porção nordeste da cidade. De um lado da avenida movimentada, cinco ou seis sapateiros – próximos uns dos outros – competiam por clientes. Atrás deles havia lojas movimentadas, lama com aspecto frágil e construções em madeira com telhado de zinco. Do outro lado da rua, a avenida está alinhada com lixo que, soubemos depois, é despejado ali pelos jovens que o coletam nas casas por cerca de 50 xelins por mês [menos de um dólar]. Tudo aqui é faça-você-mesmo, dado que o governo ignora os problemas de saneamento e resíduos que afligem as cerca de 500 mil pessoas que vivem ali.
São precisamente essas questões que o nosso grupo, liderado por Yvonne Tiany, Felix Okinyi e Mike, do Map Mathare, decidiu investigar. “Pelo mapeamento e pela blogagem tentamos chegar a um número de pessoas: encontrar os problemas, então falar com os envolvidos para achar uma solução,” disse Yvonne. Certa vez, ela explicou, refletores foram instalados ao redor de uma área de Mathare considerada particularmente perigosa à noite, especialmente para as mulheres, como resultado de apresentação do problema feita pelo grupo a um gestor local do distrito, com o apoio do mapa.
Esse ensaio fotográfico investiga questões de abastecimento de água, [gestão de] resíduos e saneamento que afetam a vida e a saúde dos moradores. Mathare é densamente povoada e falta a infraestrutura básica de saneamento e um sistema seguro de gestão de resíduos. Caminhar pela cidade com os nossos colegas locais nos fez perceber até que ponto os moradores de Mathare se engajam nesses assuntos buscando melhorar a qualidade do espaço compartilhado e dos recursos [disponíveis].
Água limpa
Mathare não tem um sistema oficial de distribuição de água. Caminhões pipa, que distribuem água limpa para os residentes nas vizinhanças mais ricas como Runda, Muthaiga, Umoja e Langata, não passam por aqui, e os moradores contam somente com bicas d´água ilegais desviadas para a favela por “empreendedores” locais. A água pode ser coletada em pontos específicos como os retratados nas fotos acima por 1 ou 2 xelins por litro. Entretanto, as bicas de água limpa normalmente correm perto de drenos a céu aberto, que podem ser vistos por todo o assentamento. Quando a água não está disponível em Mathare, membros da comunidade são forçados a ir para as áreas vizinhas e buscá-la a preços consideravelmente maiores.
Eliminação de resíduos
O descarte de resíduos é um problema importante em Mathare. O lixo normalmente é coletado por grupos organizados de jovens, que cobram cerca de 50 xelins mensais por residência. Os resíduos são então jogados em diferentes lugares e em volta do assentamento. Jovens de 8 a 17 anos podem trabalhar na coleta para gerar renda para as suas famílias. Grupos diferentes podem, às vezes, entrar em conflito por território ou por áreas de coleta.
Lugares para brincar
Crianças pequenas também assumem a responsabilidade quando o negócio é encontrar espaços para brincar em Mathare. Áreas abertas no assentamento são frequentemente utilizadas como depósitos de lixo. Algumas vezes, as próprias crianças se encarregam de limpar as áreas onde querem brincar, queimando o lixo.
Jardins urbanos
Jardins urbanos podem ser uma boa maneira de driblar os altos preços da comida e das verduras, economizando para as famílias cerca de 100 xelins ao dia. Entretanto, favelas são áreas densamente povoadas e pode ser um pouco difícil encontrar áreas para cultivo. A foto acima mostra um jardim urbano na margem de um rio, do outro lado de um grande aterro. A água usada para irrigar o jardim vem do rio poluído visto na imagem, que também recebe a água de esgotos a céu aberto que correm pelo assentamento. É por isso que alguns moradores começaram a cultivar verduras bem em frente às suas casas. A outra figura mostra couve cultivada em um “jardim em um saco”.
Mapeando para melhorar as instalações
Map Mathare tem mapeado a região para mostrar ao governo provas palpáveis da falta de instalações em algumas áreas, e estimular que as medidas necessárias sejam adotadas. Um banheiro público foi construído pela comunidade, com o apoio do gestor do distrito, depois que os jornalistas cidadãos demonstraram que a área movimentada no mercado não tinha instalações sanitárias.
Todos os voluntários são pessoas jovens da comunidade: atualmente, o grupo é composto por oito jovens entre 20 e 30 anos, sendo duas mulheres. O projeto organiza reuniões comunitárias nas quais os voluntários perguntam aos moradores quais questões os preocupam, para que eles possam ir às ruas e investigá-las. Envolver a comunidade no trabalho que fazem segue sendo seu objetivo mais importante, e também o maior desafio encarado pelo Map Mathare. Mas a dedicação desses jovens para melhorar a vida na comunidade é inspiradora e merece respeito.