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Brasil: Estado Mais Violento do País, Alagoas Pede Paz

Categorias: América Latina, Brasil, Ativismo Digital, Lei, Mídia e Jornalismo, Primeira Mão, Protesto

Enquanto escrevo este artigo, recebo a notícia [1] de que um adolescente foi executado em via pública de Maceió na noite ontem, enquanto pelo menos outros três corpos de vítimas da violência deram entrada no Instituto Médico Legal. Poucas horas antes destes últimos crimes, milhares de pessoas mobilizadas por meio das redes sociais compareciam às ruas na “Caminhada da Paz”, um apelo para o fim da violência em Alagoas.

Há muito a população de Alagoas vem se indignando por causa da banalidade da vida e do crescente número de homicídios por motivos fúteis [2]. A gota d'água para a mobilização foi o assassinato do médico José Alfredo Vasco Tenório, de 67 anos, na tarde de 26 de maio, morto com um tiro nas costas na sequência de um assalto. Somente naquele fim de semana, outras 17 pessoas foram vítimas de morte violenta no Estado.

Mancharam de sangue o Corredor Vera Arruda, onde o médico foi assassinado. Foto publicada por Allves Del Valle. [3]

Mancharam de sangue o local onde o médico foi assassinado.Foto publicada por Allves Del Valle.

A insustentável situação de insegurança levou internautas às ruas, em manifestação mobilizada por meio do grupo Alagoas – Estado de Emergência [4], no Facebook. Silvana Chamusca [5] faz um resumo da manifestação e um apanhado do debate que se seguiu “à caminhada pacífica, sem olhar para a classe social, mas com um unico objetivo, mostrar a nossa indignação”:

Participamos de um primeiro movimento, poderão ser organizados outros, então sugira, tenha iniciativa, levante dados, organize no seu bairro, ou em qualquer outro bairro, que garanto que eu estarei lá.

Criado na segunda-feira, o grupo [4] já reúne mais de 60 mil participantes. Enquanto um novo protesto [6] foi marcado para o dia 5 de junho, Toninho Cajueiro [7] pergunta:

O que foi conseguido de CONCRETO após a caminhada? Quais as providências que serão tomadas após este evento? A verdade é que a grande mobilização que precisamos fazer é na URNA, na ELEIÇÃO deste ANO, escolhendo de forma CORRETA e SEM INTERESSE os nossos políticos. Com educação de qualidade e geração de emprego se muda esse Estado.

Enquanto se mobilizam mais uma vez, usuários participam de um debate intenso sobre as causas de violência, briga de classes sociais, política e o sentimento geral da população. Mauricio Carvalho [8] acredita que questão da violência é muito complexa e não deve ser transformada em algo simplista:

A morte do Dr. Alfredo serviu de estopim, um símbolo, um mártir, aquele que nós esperamos que tenha sido a última vítima dessa violência desenfreada. Ninguém é cego, todo mundo sabe da situação caótica que Alagoas chegou, a reclamação era unânime. Ninguém é insensível ao ponto de quantificar a importância da morte de uma pessoa independentemente do lugar do planeta que ela resida ou sua classe social.

Arte publicada por Fabrício França de Oliveira no grupo Alagoas, Estado de Emergência [9]

Arte publicada por Fabrício França de Oliveira no grupo Alagoas, Estado de Emergência

Mesmo morando fora do estado há alguns anos, Eulália Lima [10] acompanha a movimentação, dizendo que já era hora das redes sociais serem usadas “para algo que seja útil de fato”:

Que sigamos bem mais longe, pelo simples fato de que o pouco que fizermos já significará um passo enorme para um Estado e um povo tão castigado. Aprender a usar o voto e a importância dele, saber que tem direitos, lutar por eles e deixar o egoísmo e o conformismo para trás, pode transformar o mundo. O ALAGOAS – ESTADO DE EMERGÊNCIA é um exemplo disso. Sair do sofá e interagir pode render gratas recompensas. Estou nessa! Parabéns a todos pelo primeiro passo!

Um abaixo-assinado pedindo intervenção imediata do Ministerio Público [11] no Estado, iniciado na terça-feira 29, já conta com mais de 2 mil assinaturas. Depois de acrescentar seu nome, Nilton Resende [12] pergunta “Que intervenção queremos? De que intervenção precisamos?”:

Os vereadores aumentaram seus salários e nós não pedimos uma intervenção. Nós somos vilipendiados constantemente pela corja de políticos que diz nos representar, e não pedimos intervenção.

Mas, queremos uma intervenção sobre os bandidos – os bandidos pobres, que matam num átimo. Pedimos essa intervenção, sem nos lembrarmos dos bandidos que nos matam lentamente há décadas.

É preciso uma mudança geral. Não adianta uma intervenção apenas repressora sem mudar a base causadora do estado de penúria de nosso Estado. Sem nos tirar da tortura constante a que somos submetidos, como eu disse no post anterior: Tortura : Torturas [13].

Passeemos por outros estados brasileiros, e veremos as UPA’s – Unidades de Pronto Atendimento. Quais foram construídas em Alagoas? Quais foram construídas em Maceió? E onde está o dinheiro que foi destinado a isso?

Na verdade, precisamos de diversas intervenções.

Crescimento vertiginoso

Gráfico do Mapa da Violência 2012 mostrando o crescimento das taxas de homicídio em Alagoas nos últimos 20 anos. A cor vermelha indica os índices nacionais, rosa representa Maceió e região metropolitana, amarela representa Alagoas. [14]

Gráfico do Mapa da Violência 2012 mostrando o crescimento das taxas de homicídio em Alagoas nos últimos 20 anos. A cor vermelha indica os índices nacionais, rosa representa Maceió e região metropolitana, amarela representa Alagoas.

A criminalidade em Alagoas apresenta acelerado e contínuo crescimento, segundo o Mapa da Violência 2012 [15], publicado pelo Instituto Sangari. O Estado ostentava nível moderado de violência no relatório de 1999, com taxa de 20,3 homicídios em 100 mil habitantes (abaixo da média do país de 26,2) e ocupando o 11º lugar no ranking de violência. Em 2010, a taxa de 66,8 homicídios em 100 mil garantiu a Alagoas o título de Estado mais violento do país pelo quinto ano consecutivo. Enquanto as taxas médias do país permanecem inalteradas, em Alagoas cresceram 228,3%, mais que triplicando nos últimos 10 anos. Apesar dos índices calamitosos, o pequeno Estado de Alagoas não chega às manchetes da imprensa nacional. Thallysson Alves [16] pede a devida atenção:

Pessoal, já que a imprensa nacional não vem a nós, vamos a ela. Enviem links que relatam a mobilização para os sites, jornais, TVs, revistas e rádios de fora do nosso Estado. Quem conhecer jornalistas de fora, adicionem ao grupo, informe. Vamos pressionar de todos os lados para que, enfim, sejamos ouvidos.

O povo alagoano está cansado e quer paz. Kika Chroniaris [17] deixa uma sugestão para mostrar isso:

Coloquem fita branca em seu carro e uma faixa na fachada de seu estabelecimento ou casa. Seja em qualquer lugar da cidade, precisamos mostrar que a cidade toda clama por PAZ.

Alagoas Pede Paz [18]

Alagoas Pede Paz. Foto publicada por Marilene da Silva no Facebook.