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Portugal: Democracia Sai à Rua a 15 de Outubro

Categorias: Europa Ocidental, Portugal, Ativismo Digital, Mídia Cidadã, Política, Protesto

Este artigo faz parte da nossa cobertura especial Europa em Crise [1].

Em Portugal, no dia de acção global [2] marcado para o próximo 15 de Outubro, “a democracia sai à rua”. O protesto apartidário, laico e pacífico está convocado para as principais cidades do país, e o apelo é feito “pela democracia participativa, pela transparência nas decisões políticas, pelo fim da precariedade de vida”:

A actual governação assenta numa falsa democracia em que as decisões estão restritas às salas fechadas dos parlamentos, gabinetes ministeriais e instâncias internacionais. Um sistema sem qualquer tipo de controlo cidadão, refém de um modelo económico-financeiro, sem preocupações sociais ou ambientais e que fomenta as desigualdades, a pobreza e a perda de direitos à escala global. Democracia não é isto!

A democracia sai à rua: principais cidades portuguesas com manifestação agendada. [3]

A democracia sai à rua: principais cidades portuguesas com manifestação agendada.

Nos vários manifestos [4] que estão em circulação, é generalizado o acentuado descontentamento com as políticas neo-liberais em vigor e com as medidas de cortes sociais e de privatização de serviços públicos impostas pela “troika” (Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia), para fazer frente à crise económica que o país atravessa. Reinvindicações mais específicas foram acrescentadas pelos cidadãos aos manifestos de cada cidade em que o 15 de Outubro está a ser organizado, como é o caso do colectivo da cidade do Porto, que aponta:

- retirem o memorando. vão embora. não queremos o governo do FMI e da troika!
– nacionalização da banca – com os planos de resgate, o estado tem pago à banca para especular
– abram as contas da dívida – queremos saber para onde foi o dinheiro
– não ao pagamento da dívida ilegítima. esta dívida não é nossa – não devemos nada, não vendemos nada, não vamos pagar nada!
– queremos ver redistribuídas radicalmente as riquezas e a política fiscal mudada, para fazer pagar mais a quem mais tem: aos banqueiros, ao capital e aos que não pagam impostos.

Dispersão na mobilização online

Somos muitos não temos medo! Cartaz de Gui Castro Felga para o 15 de Outubro [3]

Somos muitos não temos medo! Cartaz de Gui Castro Felga para o 15 de Outubro

Ao contrário do que aconteceu na preparação da manifestação “Geração à Rasca [5]“, a 12 de Março, em que mais de 70.000 pessoas confirmaram a sua presença através do evento criado no Facebook (e em que centenas de milhar efectivamente saíram às ruas), desta vez as intenções de participação contabilizadas para cada uma das cidades mobilizadoras – Angra do Heroísmo [6], Braga [7], Coimbra [8], Évora [9], Faro [10], Lisboa [11], Porto [12] e Santarém [13] – apresentam números muito baixos. Só nas duas maiores cidades do país é que foi ultrapassado o milhar de confirmações de participação, contando (à data de publicação deste artigo) Lisboa com 6.306 e o Porto com 1.652. A página [14] genérica do Facebook criada para o efeito, ainda só reuniu 1.318 “likes”.

Resta aguardar pela data para verificar se estes números representam um desinteresse pela mobilização ou se são resultado da dispersão de presenças online nas redes sociais. Enquanto isso, multiplicam-se também as convocatórias via Facebook para assembleias preparatórias [15] e a criação colectiva de cartazes [16], faixas e outros meios de comunicação em diversas praças de todo o país. Um grupo de cidadãos na organização do 15 de Outubro [17], montou um vídeo intitulado “Não arranjes desculpas!”, que pretende ridicularizar as motivações de quem decide não sair para as ruas:

Na grande mídia, a organização da manifestação tem recebido pouca atenção. Notícias [18] reportaram os receios do Governo sobre a possível “perturbação da paz social” decorrente das manifestações,  receios esses repudiados [19] pela organização num comunicado à imprensa. Renato Teixeira, do blog 5dias.net, resumiu [20] as declarações do Governo como uma “estratégia de medo” para afastar os indignados das ruas.

Tomás Vasquez, do blog Hoje Há Conquilhas, comenta [21] uma reportagem sobre a manifestação do 12 de Março que passou recentemente num dos principais canais de televisão portugueses:

a peça televisiva terminou assim: «A polícia teme que esta movimentação social possa provocar tumultos, os maiores desde 1975». O mundo está a ficar perigoso, os senhores do dinheiro põem e dispõem; a Europa está de rastos e quem paga a factura dos desmandos financeiros são sempre os mesmos, mas quando cidadãos querem mostrar o seu desagrado e «mijam fora do penico» ficam todos em pânico. Compreender os fenómenos sociais e políticos novos em vez de os atacar com caçadeira de canos cerrados é a melhor maneira de contribuir para uma sociedade mais justa e igualitária que cada vez se afasta mais do nosso horizonte.

Para finalizar, o blogue Ladrões de Gado partilha [22] a sua visão numa reflexão sobre a mobilização colectiva:

Quero aprender com todas as experiências que levaram a luta pela emancipação do mundo a algum lado, por mais tenebrosa que tenha sido a derrota. Quero saber das meias vitórias e não do número de pessoas na rua das 15h às 21h de um dia qualquer. (…) É preciso que toda a gente se junte, sim, mas contra o que vivemos agora (e o que temos vivido até agora) e não só por si. (…) A quantidade de vezes que leio e oiço ‹‹eu›› e ‹‹tu›› nestas convocações para o 15 de Outubro [23] faz-me alguma coisa confusão. Não que cada um não seja uma pessoa diferente, (…) mas o que está aqui em causa não é eu e tu, somos nós e a forma como queremos viver uns com os outros.

Este artigo faz parte da nossa cobertura especial Europa em Crise [1].