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Brasil: Apesar dos Protestos, Governo Insiste com Belo Monte

Categorias: América Latina, Brasil, Direitos Humanos, Indígenas, Meio Ambiente, Protesto

Este post faz parte de nossa cobertura especial Floresta em Foco: Amazônia [1].

A controvérsia sobre o impacto das represas da usina hidrelétrica de Belo Monte [2], a 3ª maior do mundo em capacidade instalada, a ser construída em plena Amazônia, no estado brasileiro do Pará, tem novos desdobramentos. No dia 1º de junho, o atual presidente do Ibama [3] (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Sustentáveis), o advogado Curt Trennepohl, fez o que seus antecessores haviam se recusado a fazer: concedeu licença de instalação de Belo Monte [4].

Principalmente desde 2008 [5], quando a então ministra do meio ambiente Marina Silva deixou o cargo, que a resistência dos órgãos ambientais em conceder licença de instalação ao projeto vinha se intensificando, assim como os protestos de populações indígenas [2] afetadas e o rechaço por parte de grupos ambientalistas. Estes movimentos no entanto não foram o bastante para convencer o governo brasileiro a mudar de ideia quanto à usina. A conclusão da usina hidrelétrica de Belo Monte está prevista para 2015, com a expectativa de gerar 11 mil megawatts [6] de potência para atender 26 milhões de brasileiros.

Dilma: Respeite os povos do Xingu, PARE Belo Monte [7]

Dilma: Respeite os povos do Xingu, PARE Belo Monte

O Ministério Público Federal do Pará também se posicionou de forma contrária ao projeto. Emitiu uma recomendação para a nova presidência do Ibama para que negasse a licença de construção da hidrelétrica.

Nem mesmo o apelo emitido no início de abril [8] pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) conseguiu exercer algum tipo de influência. A OEA respondia positivamente à denúncia feita por grupos indígenas e ecológicos, com uma medida cautelar ao governo brasileiro. O governo, em resposta, emitiu nota a considerar as solicitações [9]da CIDH “precipitadas e injustificáveis”. O Senado brasileiro repudiou a posição [10] da OEA e aprovou, em 11 de junho, um voto de censura à organização [11] interamericana.

Para o jornalista Leonardo Sakamoto, a resposta do governo, divulgada no final do mês de maio, foi “mirim”. Ele analisou a resposta do governo [12] de forma irônica:

Mesmo que ele não quisesse mudar uma pedrinha no planejamento da hidrelétrica, poderia ter respondido de forma amena, enrolando a história, passando a imagem de democrata preocupado com as minorias e de respeitoso às demandas de organismos internacionais, enquanto faria o seu trabalho de rolo-compressor nos bastidores.

Pare Belo Monte: na rede e na rua

Usuários do Facebook mudam fotos do perfil para índios do Xingu [13]

Usuários do Facebook mudam fotos do perfil para índios do Xingu

No início de junho, surgiu uma movimentação peculiar no Facebook. Alguns usuários mudaram suas fotos do perfil para fotos de indígenas da Amazônia. Embora não se possa precisar o número exato, com o passar dos dias, o número de adeptos esteve a crescer e divulgavam a mensagem:

Troque a foto do seu perfil pela foto de um índio do Xingu.
E vamos parar Belo Monte. Compartilhe.
Essa é a nossa tribo. Somos todos índios!

Na tarde do dia 20 de maio, índios da região da Volta Grande do Xingu estiveram em São Paulo, onde fizeram uma manifestação em frente ao Museu de Arte de São Paulo (MASP).

No dia 26 de maio, fizeram circular na internet uma imagem do cacique kayapó [14] Raoni a chorar. Segundo a mensagem que acompanhava a foto, o cacique chorava porque a presidente Dilma teria concedido licença à usina de Belo Monte. Muitos replicaram essa informação, que se revelou falsa. O blogueiro Robson de Souza desvendou o boato [15] em seu blog dois dias depois. Ele contestou os dados da mensagem, corrigiu que a foto era de 2002, durante o enterro do indigenista Orlando Villas-Bôas e comentou:

Não sou defensor de Belo Monte, muito pelo contrário. Sou totalmente contra a construção daquela usina, que poderá inundar mais de 500km² de floresta e, de quebra, prejudicar muitos indígenas. Mas também sou contra a divulgação de boatos. Se é para impedir Belo Monte de ser construída, que seja com a verdade, não com mentiras.

A notícia da licença de construção chegou dia 1 de junho. Dois dias depois, 3 de junho, cidadãos contrários ao projeto protestaram em Salvador, condenando o impacto ambiental que a represa vai causar para as populações da região:

PROTESTO CONTRA BELO MONTE [16] de Lucas Tanajura [17] no Vimeo [18].

Para os dias 5 e 19 de junho, tinham sido convocados protestos nacionais para Salvador, Rio de Janeiro, Campo Grande e São Paulo, como divulgou o portal Xingu Vivo [19]. Como pauta, além da rejeição ao projeto da hidrelétrica de Belo Monte, os manifestantes têm aproveitado também para criticar outra questão importante: a aprovação do controverso novo Código Florestal [20] na Câmara dos Deputados. Com as faces pintadas para lembrar os índios do Xingu, os manifestantes tocaram tambores durante o percurso e levaram mensagens de crítica nos seus cartazes.

As fotos que se seguem são do Flickr de Guima San [21]:

[22]

Em São Paulo, no dia 5 de junho. Os cartazes dizem: "Xingu, perdão!", "Energia eólica!" e "Pelos direitos animais!". Foto do usuário do Flickr Guima-San, compartilhada sob licença Creative Commons (CC BY 2.0).

[23]

Manifestação em São Paulo no dia 5 de junho. Cartazes dizem: "Não apoie esse crime!" e "Fora Belo MONSTRO!". Foto do usuário do Flickr Guima-San, compartilhada sob licença Creative Commons (CC BY 2.0)

[24]

Manifestação em São Paulo, no dia 5 de junho. A faixa diz: "Xingu Livre". Foto do usuário do Flickr Guima-San (CC BY 2.0).

Os críticos do projeto prometem mais mobilizações. No dia 16 de junho, as organizações que defendem os povos indígenas da região da Volta Grande do Xingu, na Amazônia paraense, recorreram novamente à instância internacional. Deram entrada em uma petição com denúncias contra [25] os direitos humanos por parte do governo brasileiro, por não ter consultado as populações locais devidamente e por ter ignorado a medida cautelar emitida pela organização interamericana no início de abril. O Brasil pode ser julgado na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA.

Enquanto isso, famílias dos bairros mais pobres de Altamira que devem ser alagadas por Belo Monte, já começaram a procurar terrenos [26]em desuso na periferia da cidade, sendo que há relatos de carga policial [27] em resposta.

Um grupo de brasileiros produziu um curta documentário sobre o impacto da usina, com o título Belo Monte: Anúncio de uma Guerra. O vídeo é uma produção independente divulgada na internet há cerca de um mês, que busca continuidade via crowdfunding [28]:

BELO MONTE, ANNOUNCEMENT OF A WAR [29] from André Vilela D'Elia [30] on Vimeo [18].

 

Este post faz parte de nossa cobertura especial Floresta em Foco: Amazônia [1].

Para entender o caso: Outros dois posts analisam a usina hidrelétrica de Belo Monte, em momentos anteriores à aprovação da licença de instalação, concedida em junho pelo Ibama. O Xingu não tem lugar para Belo Monte [31], de outubro de 2010, e Hidrelétrica de Belo Monte retorna ao foco das atenções [5], escrito em janeiro de 2011.