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Brasil: O Futuro das Florestas em Jogo

Categorias: América Latina, Brasil, Ativismo Digital, Desenvolvimento, Lei, Meio Ambiente, Mídia Cidadã, Política, Protesto

Este post faz parte de nossa cobertura especial Floresta em Foco: Amazônia [1].

Nas últimas semanas, o Congresso Nacional brasileiro tem estado em polvorosa com a pressão para votar o novo Código Florestal. O projeto, baseado em propostas de mudança ao Código vigente, é apoiado por uma coalizão de deputados da chamada “Bancada Ruralista”. O Código proposto suscitou controvérsia [2] em meados de 2010, assim como em Dezembro do mesmo ano, quando a pauta foi enviada às pressas para votação, enquanto ambientalistas estavam em Cancún [3] para a COP 16.

A proposta em discussão estabelece novos parâmetros para o manejo de florestas e de áreas de proteção ambiental em todos os 6 biomas do Brasil: Caatinga [4], Cerrado [5], Pampas [6], Mata Atlântica [7], Pantanal [8] e a Amazônia [9]. A lógica por trás do projeto é de que o agronegócio é entravado pelo atual Código Florestal, e que o Brasil está a perder oportunidades para um maior desenvolvimento econômico.

A truckload of timber leaves the Amazon. -- Deforestation and the timber industry on the Amazon. Photo by Christian Franz Tragni, copyright Demotix (18/02/2009) [10]

Caminhão carregado de madeira saindo da Amazônia. — Desmatamento e indústria de madeira na Amazônia. Foto por Christian Franz Tragni, copyright Demotix (18/02/2009)

O Código Florestal

O Código Florestal proposto incorpora o conceito de ‘área rural consolidada’, garantindo um caráter legal a áreas cultivadas ilegalmente (concede, portanto, anistia a desmatadores); reduz a faixa de mata ciliar (as áreas de várzeas/igapós) para proteção obrigatória; permite ocupação e uso de terras acima de 1.800 m (que são atualmente protegidas); modifica os parâmetros para as Áreas de Proteção Permanente (APPs), a serem substituídas por estatutos elaborados por cada unidade da federação; elimina o caráter compulsório das reservas legais em pequenas propriedades; permite o replantio de áreas degradadas com plantas exóticas (ao invés de espécies nativas somente); e permite a compensação de terras devastadas pela proteção de uma área em outra parte do país (por exemplo, uma área devastada da Mata Atlântica poderia ser compensada por uma área protegida no Cerrado).

Havia rumores de que a versão apresentada pelo deputado federal Aldo Rebelo [11] (Partido Comunista do Brasil – PCdoB) ao Congresso em 10 de Maio havia sido finalizada momentos antes da sessão de votação. O rumor causou rebuliço para que a sessão fosse adiada, pois a versão final do projeto não estava disponível para leitura. A ex-ministra do Meio Ambiente e ex-candidata à Presidência Marina Silva [12] (@silva_marina) havia tuitado em 10 de Maio [13]:

Não se sabe quais propostas da sociedade e do governo estão no relatório do Aldo. Será um desrespeito se o Código Florestal for votado hoje.

Em 12 de Maio, no Plenário da Câmara, quando os deputados mencionaram a mensagem de Marina Silva para demandar mais tempo estudando o relatório, Aldo Rebelo acusou o marido de Marina Silva de desmatamento ilegal. Ele declarou ainda, no entanto, que havia preferido poupá-lo na época e não o acusou.

Com base nessas declarações, que foram transmitidas na TV, o usuário do Youtube CiFuDetube [14] (acrônimo para Cidadania, Futuro e Democracia), aconselhou netcidadãos a clamar pela cassação de Aldo Rebelo, por ter confessado publicamente sua má conduta.

http://youtu.be/vXaYzt2PQnQ [15]

Agronegócio, o futuro da economia brasileira?

Segundo o jornalista João Peres [16], na Rede Brasil Atual, a “bancada ruralista” é composta de 170 deputados e 18 senadores, que apoiam abertamente o agronegócio e que, alguns casos, são fazendeiros também. A senadora Kátia Abreu é uma membro conhecida da bancada ruralista, sendo também uma grande produtora da indústria de carnes. Desde 2008, ela é presidente da Confederação Nacional de Agricultura e Pecuária (CNA), e está ansiosa para ver o novo Código aprovado.

Ela tuitou [17] (@KatiaAbreu) que a “modernização do Código Florestal está sendo feita de forma democrática e responsável”. Em seguida, tuitou em defesa de seus esforços [18]:

Não somos desmatadores. Não exploramos madeira em reserva ambiental. Somos produtores de alimentos. Sustentamos o Brasil. #codigoflorestalja [19]

Durante a COP 16, a Senadora Abreu (membro do Partido Social Democrático – PSD) foi homenageada com o prêmio Motosserra de Ouro [20] pelo Greenpeace Brasil, em reconhecimento de seus “esforços pelo desmatamento”.

Rise in deforestation in the Amazon Rainforest - The Brazilian Amazon rainforest had 5.850 km2 of its legal area deforested from August 2009 to April 2010, according to INPE- Instituto de Pesquisas Espaciais. Photo by Ronnie Luis Leite, copyright Demotix (20/11/2007). [21]

Aumento de desmatamento na Floresta Amazônica – A floresta amazônica brasileira teve 5.850 km2 de sua área legal desmatada entre Agosto de 2009 e Abril de 2010, de acordo com o INPE – Instituto de Pesquisas Espaciais. Foto por Ronnie Luis Leite, copyright Demotix (20/11/2007).

O deputado Aldo Rebelo é o relator responsável pelo projeto do novo Código Florestal em votação no Congresso. Apesar das críticas que tem recebido, o sr. Rebelo continua um apoiador incondicional ao projeto. Apesar de estar na base aliada do governo Dilma Rousseff [22], ele tem demonstrado maior afinidade com os pontos defendidos pela bancada ruralista que com a proposta menos agressiva proposta pela presidência.

Rafael Chiaravalloti escreveu em seu blog [23] Diário do Verde sobre os efeitos danosos do projeto do novo Código Florestal e chamou Rebelo de marionete:

Aldo Rebelo, um ex-militante da luta pela democracia na época que os militares criaram o código, é apenas uma marionete desse processo.

Ambientalistas e cientistas rejeitam a proposta

Preocupados com a forças poderosas por trás do novo Código Florestal, ONGs ambientalistas como o Greenpeace Brasil e o WWF Brasil e institutos, como o ISA – Instituto Socioambiental – e o IPAM – Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia -, entre outros, uniram forças em 2010 para lutar contra o novo Código. O site SOS Florestas [24] tem o objetivo de oferecer um conteúdo que possa contrapor com as informações atuais disseminadas. O argumento é de que mentiras têm circulado [25] sobre a maneira com que o Código Florestal foi elaborado, e de que é necessário divulgar o seu potencial efeito negativo nos ecossistemas do Brasil.

A iniciativa criou petições virtuais [26] com o Avaaz para que o atual Código Florestal seja mantido. No Twitter, usam a hashtag #SOSFlorestas [27], e produziram um vídeo [28] para informar sobre as possibilidades prejudiciais do novo código proposto, especialmente quanto ao fim proposto de reserva legal de floresta em pequenas propriedades e à menor restrição para as Áreas de Proteção Permanente (APPs) em margens de rios e montanhas, que provocam grandes impactos nas cidades [29].

A Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciência (ABC) se pronunciaram publicamente para demandar uma moratória de dois anos [30] no debate sobre o Código Florestal no Congresso. As duas instituições concordam que o Código precisa de modificações, mas argumentam que as atuais propostas não apresentam um embasamento científico suficiente para as novas determinações de reserva legal, modificação nas áreas de proteção em matas ciliares e margens de rio, entre outras propsotas.

“Efeito Aldo”: Desmatamento está crescendo

Há alguns dias, o Instituto Centro de Vida (ICV) e o Imazon, instituições que conduzem pesquisas e defendem o manejo sustentável dos biomas brasileiros, reportaram que o desmatamento [31] havia crescido no estado do Mato Grosso, na contramão da tendência anterior de taxas de desmatamento menores:

Em abril de 2011 o desmatamento atingiu 243 quilometros quadrados em Mato Grosso, o que corresponde a aumento expressivo de 537% em relação a abril de 2010 quando o desmatamento somou apenas 38 quilometros quadrados.

Você pode ver mapas e gráficos aqui [32], a comparar as taxas no Mato Grosso nos últimos quatro anos. Como argumenta o jornalista Leonardo Sakamato [33], trata-se de uma corrida para desmatar novas áreas, uma vez que o Código Florestal vai conceder anistia aos proprietários. Ambientalistas chamaram o acontecimento de “Efeito Aldo”.

"Protect our woods - Save the Forest Code" Photo from the blog of the AASPAFF (Association for Social Action and Conservation of Water, Fauna and Flora of the northern Chapada), used with permission. [34]

"Protect our woods – Save the Forest Code" Photo from the blog of the AASPAFF (Association for Social Action and Conservation of Water, Fauna and Flora of the northern Chapada), used with permission.

Manifestações ocorreram em diversas partes do país, como na pequena cidade de Jacobina [34], Bahia. O SOS Florestas convocou os cidadãos para uma grande demonstração no domingo [35], dia 22 de Maio, em São Paulo.

Este post faz parte de nossa cobertura especial Floresta em Foco: Amazônia [1].