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Brasil: Polêmica do blogueiro baleado desperta solidariedade

Categorias: América Latina, Brasil, Ativismo Digital, Direitos Humanos, Liberdade de Expressão, Mídia e Jornalismo

O blogueiro brasileiro Ricardo Gama, “contundente crítico [1]” do Governador do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho [2], e do Prefeito da cidade, Eduardo Paes [3], assim como “um dos mais prediletos militantes da blogosfera [4]” sobre casos de abuso de poder e outras irregularidades por parte da polícia no Brasil, foi baleado [1] na quarta-feira, dia 24 de março.

O blogueiro Marcelo Delfino, do blog Brasil, um País de Tolos relatou [4] o crime:

Ricardo Gama […] foi baleado hoje de manhã em Copacabana. Levou dois tiros no rosto e um no tórax, disparados por um homem que o abordou em um carro prata.

Arquivo de blog “politicamente incorreto”

Polêmico, Gama é conhecido por gravar vídeos com denúncias contra o governo e postá-las em seu blog [5], ganhando admiradores e inimigos por onde passa. Poucas horas antes do ataque, Gama publicou dois posts que criticavam os governantes do Rio de Janeiro – “seus alvos prediletos”, como comenta [6] o blogueiro Antônio Mello –  pela nova forma de divulgação dos dados da dengue na cidade [7] e pela prisão de militantes políticos [8] durante a visita de Obama ao Brasil (reportada [9]pelo Global Voices).

Esta não é a primeira vez em que Gama é vítima de um atentado, diz [10] Conceição Oliveira, do blog Maria Frô:

Ricardo Gama é aquele blogueiro que ficou famoso por exibir durante a campanha eleitoral um vídeo em que um adolescente negro cobrava o governador Sérgio Cabral e era destratado por este.

Em fevereiro durante a ocupação do Complexo do Alemão o Carro do blogueiro Ricardo Gama já tinha sido alvejado como ele denuncia aqui [11].

Sobre este particular atentado e respetiva investigação, o jornalista Antônio Mello lança algumas informações [12] preocupantes:

A polícia ainda não tem pista alguma sobre o autor dos disparos. Testemunhas afirmam que ele chamou Ricardo pelo nome e este, quando se virou para ver quem o chamava, foi atingido pelos tiros. Ao cair, sempre segundo testemunhas, Ricardo teria repetido algumas vezes “queima de arquivo, queima de arquivo”.
[…]
Há pouco tempo teve um bate-boca com um policial da Delegacia de Copacabana [13], por causa do registro de uma ocorrência que o delegado se recusou a fazer. Nome do delegado: Bruno Giladerte, o mesmo que investiga agora o atentado.

Enquanto a polícia do Rio de Janeiro trabalha, nestes moldes, com a hipótese de que seus textos tenham motivado [14] o crime, na blogosfera começaram as conjecturas sobre as razões do atentado.

O escritor José Fonte de Santa Ana comenta [15]:

A probabilidade de motivação política paira no ar porque Ricardo Gama fazia inúmeras denúncias sobre os descasos da administração pública (…).

O ex-candidato ao governo do Rio de Janeiro, Fernando Peregrino, se pergunta [16] se Gama terá despertado intolerância política com a sua militância online:

Que Ricardo Gama é um militante social criativo e audacioso ninguém tem duvida. Mas será que ele despertou a intolerância política em nossa terra? […] mas será que ele despertou a intolerância política e o uso de métodos criminosos para resolver divergências políticas. Ricardo exercia uma função jornalística destacada, então por que as instituições do setor não consideram um Atentado à liberdade de Imprensa? Ou elas só gritam para defender a liberdade de Empresa, e não de Imprensa como um todo. Será um recado? Podemos todos dormir tranqüilos de que as instituições de defesa da democracia estão em boas mãos?

O taxista e blogueiro Jorge Schweitzer prefere não acreditar [17] que o crime tenha motivos políticos:

Descreio que a falta de inteligência ou motivação por ódio pelo blogueiro tenha levado algum político a tramar eliminar Ricardo Gama…Seria muita burrice…

[18]

O blogueiro Ricardo Gama, printscreen de vídeo postado por ele na rede.

Paulo Ricardo Paúl, professor, coronel e ex-corregedor da Polícia Militar do Rio de Janeiro, e amigo de Ricardo Gama, no dia do atentado desabafou [19] através do  Twitter  que a “mídia independente do Rio sofre atentado a bala”. Paúl acredita [20] que os “indícios iniciais” do crime “[sinalizavam] tentativa de execução” e  não descarta [21] a possibilidade de um atentado com conotação política:

É muito cedo para falar em atentado com conotação política, uma hipótese que não pode ser desprezada, em face de Ricardo Gama criticar e denunciar diariamente os governos federal, assim como, o estadual e o municipal do Rio de Janeiro.

Blogosfera Solidária

Para alguns blogueiros, como Bruno Kazuhiro, do blog Perspectiva, o atentado foi um [22] “claro ataque à liberdade de expressão”. 

Poucas horas depois do ataque, no Twitter o publicitário João Carlos Caribé (@caribe [23]) demonstrava [24] a sua solidariedade:

A blogosfera precisa entender que somos todos Ricardo Gama, estamos todos sujeitos ao mesmo que ele, ou você tem duvida?

"Nao Toquem nos Blogueiros". Video do protesto de 30 de março por coronelprpaulo no Youtube [25]

"Nao Toquem nos Blogueiros". Video do protesto de 30 de março por coronelprpaulo no Youtube

No dia seguinte, 25 de março, Fernando Peregrino anunciava a criação do movimento “Não Toquem nos Blogueiros [26]“, que pretendia juntar “todos que fazem ou lêem blogs e que agora sentem-se atingidos com a tentativa de calar um de nós, o Blogueiro Ricardo Gama!”. O movimento realizou o primeiro “ato cívico-democrático [27]” uma semana após o atentado, dia 30 de março, embora com algumas restrições impostas [28] pelo Governador Sérgio Cabral.

No dia seguinte, 31, Ricardo Gama recebia alta [29] do Hospital Copa D´or onde esteve internado em recuperação das cirurgias que sofreu. Do Hospital, tinha dado uma entrevista [30] a um jornal de alcance nacional prometendo que logo voltaria a blogar. Desde o dia 31, o blogueiro tem publicado quase diariamente, ainda com um ar visivelmente ferido [31], e a promessa mantém-se: [32]

No mais esse blog em nada mudará, e vamos em frente.

A organização Repórteres Sem Fronteiras divulgou nota exigindo [33] “uma investigação firme e profunda sobre o atentado”. Aguarda-se no entanto o desenvolvimento da investigação policial para se saber se se trata ou não de “mais um caso da perseguição que sofrem determinados blogueiros e jornalistas com senso crítico afiado”, como aponta [34] A.F do blog Mingau de Aço.