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Brasil: Hidrelétrica de Belo Monte retorna ao foco das atenções

Categorias: América Latina, Brasil, Ativismo Digital, Direitos Humanos, Economia e Negócios, Governança, Indígenas, Meio Ambiente, Política

O governo de Dilma Rousseff [1] mal começou e já enfrenta uma mobilização virtual, e a causa é ambiental. Em 7 de janeiro, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, falou que a licença de construção da usina hidrelétrica de Belo Monte [2] seria “antecipada”, para que as obras fossem iniciadas em fevereiro próximo. Para o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), o ministério ainda precisa atender exigências que comprovem a viabilidade ambiental da obra. Dias depois, em 12 de janeiro, Abelardo Bayma, presidente do Ibama, pediu exoneração do cargo que ocupava desde abril de 2010, alegando motivos pessoas. O blog Político, da revista Época, publicou, no entanto, sobre o que seria o verdadeiro motivo [3]:

Em reuniões com a diretoria da Eletronorte há dez dias, Abelardo se negou a emitir a licença definitiva para a construção da usina. Ele argumentou que o IBAMA não poderia emitir o documento porque o projeto ainda está cheio de pendências ambientais.

O blogueiro e jornalista Leonardo Sakamoto considera a usina hidrelétrica de Belo Monte, que é planejada para o rio Xingu [4], no estado do Pará, “talvez a mais polêmica das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)” – um dos principais programas do governo. Ele comenta o post [5] do blog Político e critica o projeto da usina:

De qualquer forma, o ponto é o seguinte: Belo Monte será um grande gerador de impactos sociais e ambientais. Por exemplo, o Ministério Público Federal avalia em cerca de 40 mil o total de atingidos – incluindo populações tradicionais e indígenas.

Mobilização e petição virtual

Assim que surgiu esta nova polêmica para a licença da usina de Belo Monte, o site de petições online Avaaz lançou uma petição [6], convocando assinaturas com urgência. Em 17 de janeiro, cinco dias após a criação da petição, o Avaaz orgulhosamente tornou pública a marca de 150,000 assinaturas. Naquele momento, a petição ultrapassava a marca de 275,000 assinaturas, e isso pode ser atribuído em grande parte à mobilização no Twitter. Usuários da plataforma tuitaram diversas vezes a mesma mensagem nos últimos dias:

Assine a petição contra Belo Monte: impeça este desastre ambiental na Amazônia! http://avaaz.org/parebelomonte [7]

Entre esses usuários, estava Andréa (@AndrelBarbour), que complementou [8]:

Aproveitando pra ler mais sobre a questão de Belo Monte.. É importante q a gente saiba direitinho o q ta acontecendo, diz respeito a tds nós!

[9]

Cabeçalho de petição contra a hidrelétrica de Belo Monte no site Avaaz

Na contramão está o blogueiro Alexandre Porto, que escreveu o post “Eu não assino petições contra a Belo Monte [10]“. Apesar dos impactos ambientais, ele acredita que a obra tem mais pontos a favor e que a mobilização contrária à usina seria exemplo do que chama de “ambientalismo santuarista”, mais preocupado em preservação que na realidade sócio-econômica. Em seu post, contesta cada parágrafo da petição do Avaaz:

Já os pouco mais de 500 índios, que moram a jusante da barragem principal, onde o volume de água diminuirá no período de chuva, poderão ser realocados em nova aldeia, vizinha aos canais ou ao próprio reservatório principal.

[Belo Monte] […] envolve danos sócio-ambientais é óbvio, mas em alguma medida qualquer fonte energética pede seu preço. Produzir uma média segura de 4.000 MW durante o ano, com picos de 11.000 MW, é complexo para qualquer matriz, mesmo as aparentemente mais brandas.

Infográfico com projeto de barragem e reservatório da usina, na região conhecida por Volta Grande, no rio Xingu. Imagem publicada no blog de Alexandre Porto, com fonte original no Jornal O Liberal de 03/02/2010.

Repercussões da usina de Belo Monte

Ressaltando exatamente o impacto da obra nas populações indígenas e ribeirinhas que vivem às margens do rio Xingu, Elisa Thiago escreveu [11] em outubro de 2010 sobre a usina de Belo Monte para o Global Voices em Português. Elisa ressalta que a resistência dessas populações não é de agora:

Por trás desse discurso oficial de “normalidade” criado pelo governo, pessoas organizadas em movimentos sociais e ambientais vêm construindo, desde a década de 1970, sua própria história de resistência à construção de Belo Monte. São elas índios e ribeirinhos, cujos modos de vida e meios de sobrevivência atuais sofrerão um impacto desastroso com a construção da usina.

Ao longo de 2010, Belo Monte recebeu atenção repetidamente. Em 20 de abril de 2010, o Greenpeace Brasil realizou um incisivo ato [12] de oposição ao projeto, quando ativistas despejaram 3 toneladas de esterco na entrada da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em Brasília, com a mensagem “Belo Monte de… problemas [13]“.

Em setembro de 2010, o Movimento Xingu Vivo Para Sempre (MXVPS) lançou [14] um abaixo-assinado contrário à usina, que até o momento tem mais de 5,000 assinaturas. Lançou, também, um vídeo [15], que desde então tem circulado na blogosfera. O vídeo mostra a simulação de como a barragem e o reservatório de água no rio Xingu afetariam a dinâmica natural da região.

Telma Monteiro, em seu blog TelmadMonteiro, divulgou [16], no fim de dezembro de 2010, o resultado de uma pesquisa [17] da qual participou para as organizações Amigos da Terra – Amazônia Brasileira e International Rivers. A pesquisa analisou os riscos para investidores, e o resultado que apontam se pode apreender pelo título do relatório:

O relatório “Mega-projeto, Mega-riscos” vem em bom momento, como um alerta inequívoco de que Belo Monte é ainda um mega-projeto que pode se transformar em mega-obra com mega-riscos para a sociedade.

O relatório aponta dados que atestam o prejuízo de bilhões de reais da construção usina, mesmo com a venda da energia num período de dez anos. Também aponta para a taxa reduzida de produção de energia, pois a previsão de 4,420 MW corresponde a 39% da capacidade instalada de 11,233 MW. Para se ter uma dimensão do projeto, a Belo Monte, se for construída, será a 3ª maior usina hidrelétrica do mundo em capacidade instalada, atrás de Três Gargantas [18], na China, e da Itaipu Binacional [19], compartilhada por Brasil e Paraguai.

Vale recordar que Abelardo Bayma não é o primeiro a sair em meio a pressões pela usina. O impasse sobre a viabilidade sócio-ambiental de Belo Monte é tido como o motivo da saída da ex-ministra do Meio Ambiente (e adversária de Dilma nas eleições presidenciais de 2010), Marina Silva [20], em 2008, e de Roberto Messias [21], ex-presidente do Ibama, em abril de 2010. Assim como Bayma, Messias também havia atrelado a concessão da licença de construção ao cumprimento de exigências sobre a viabilidade ambiental.

Cogitado desde 1975, o projeto da hidrelétrica foi retomado durante o governo do ex-presidente Lula [22] e é apoiado pela presidente Dilma desde quando fazia parte da gestão anterior. Enquanto o governo se preocupa com autonomia energética, brasileiros em blogs e no Twitter atentam para os impactos sócio-ambientais da fonte de energia escolhida – Belo Monte tem se mostrado uma poderosa queda-de-braço.