Brasil: Blogueiras falam da primeira presidenta: sim, ela pode!

A imagem que faltava: Dilma, a guerreira, com faixa presidencial. Do blog Abundacanalha

Em janeiro de 2011, ao assumir a Presidência do Brasil, Dilma Rousseff inaugura uma nova era na história política do país: ela será a primeira mulher em um grupo onde figuram 35 presidentes, todos homens. Dilma será ainda a primeira brasileira – e 18ª mulher – em um restrito clube de líderes femininas que estão atualmente no poder como presidentes ou primeiras-ministras de seus países.

Para Adriana Tanese Nogueira, esse momento histórico é certamente um sinal da mudança dos tempos, e conta com proporções ainda não completamente avaliadas. Segundo a blogueira, só o tempo poderá mostrar a extensão do significado da eleição da primeira mulher à presidência do Brasil:

É importante sublinhar o profundo sentido simbólico dessa eleição: é uma mulher que está no posto mais alto da sociedade e se trata de uma mulher que entrou na luta armada contra a ditadura militar. É grandioso.

As mulheres conscientes deste país estão todas de olho na Dilma esperando dela que faça justiça à condição feminina brasileira e que apresente uma referência de mulher forte, atrevida e inteligente.

A esquerda e todos os anti-ditadura, todos os que prezam a democracia e que não se acomodam em papeis convenientes e com o dinheiro no bolso, olham para esta eleição com orgulho.

Cynthia Semirames aproveita para traçar a história política do Brasil do ponto de vista feminimo, lembrando que na década de 20, quando a avó dela nasceu, o voto era proibido para mulheres, que só conquistaram o direito de ajudar a  decidir os rumos do país em 1932. Para ela, a eleição de Dilma é um jato de esperança para muitas outras brasileiras:

É interessante perceber que a primeira mulher a chegar à presidência do Brasil não tenha vindo da política (uma das áreas mais machistas que existe): ela se destacou e foi escolhida como candidata pela sua capacidade profissional. É um exemplo e uma esperança para tantas mulheres que são excelentes profissionais, mas que mas encontram um teto de vidro impedindo o reconhecimento de seu trabalho e sua ascensão aos mais altos cargos.

É maravilhoso saber que quebramos o teto de vidro e elegemos Dilma Rousseff: uma profissional extremamente competente que será uma presidenta de esquerda.

Os tempos são outros, e chama novos questionamentos: afinal, Dilma será presidente ou presidenta? Dad Squarisi explica que dicionários de língua portuguesa registram os dois termos, e que, no fundo, há uma questão de poder feminista no discurso em jogo. Ela nota que até pouco tempo não havia motivos para preocupações com a terminologia:

A questão é recente. Há poucos anos não passava pela cabeça de ninguém a possibilidade concreta de uma mulher ostentar, de fato, a faixa verde-amarela. Falava-se no assunto como hipótese utópica. Até chegar lá… Ops! Chegamos. O número de eleitoras ultrapassou o de eleitores. O voto feminino passou a ser disputado a tapa.

Voltando um pouco mais no tempo, a verdade é que o Brasil chegou a ter governos femininos em três ocasiões antes da Proclamação da República: A rainha de Portugal D. Maria I  comandou o país à distância a partir de 1777; Maria Leopoldina, esposa de D. Pedro I, se tornou a primeira imperadora do Brasil em 1822; e a Princesa Isabel, que foi regente do país na ausência do pai. Para Maíra Kubík Mano, o fato de todas elas serem provenientes da Família Real Portuguesa reforça a importância de Dilma como a primeira mulher eleita pelos brasileiros. Principalmente quando se trata do comando de um país que tem muito pouca representação feminina em cargos políticos, e ainda muito a evoluir em políticas para as mulheres:

Simbolicamente esse é um fato incrível, independente de sua matiz ideológica. Em especial se considerarmos o quanto as mulheres seguem sub-representadas na política nacional: nessa última legislatura, éramos apenas 8,97% da Câmara Federal e 12,34% no Senado, número que caiu em 2010. Aliás, se nossa base de cálculo fosse essa, eu arriscaria afirmar que demoraríamos mais uns cem anos para ver a cena que ocorre hoje. (…)

Dilma será a terceira mulher presidente na América do Sul e seria bom se, em alguns pontos, ela seguisse o exemplo de suas correlatas. Michelle Bachelet, ex-mandatária chilena e atual diretora da ONU Mulher, nomeou 50% de mulheres em seu gabinete quando presidente – medida tomada também pelo boliviano Evo Morales. Já a argentina Cristina Kirchner não só aprovou o matrimônio gay como deixa o país a um passo de descriminalizar o aborto.

Apesar de toda exaltação da eleição da primeira presidenta, Edi Machado acha que não houve exatamente uma mudança de mentalidade da população, e defende que Lula foi o candidato real, sendo Dilma a candidata nominal nessa eleição:

Demérito de Dilma? Não de forma alguma, só acho que realmente quem venceu realmente foi Lula. Que não há como negar que dentro do que lhe foi “permitido” fez o que foi proposto nas suas inúmeras candidaturas até ser eleito em 2002 e reeleito 2006 e eu diria que eleito novamente agora em 2010. Sim porque ela só venceu pois tinha todo o apoio dele. (…) Só nos resta esperar e rezar pra que Deus acompanhe a primeira “presidenta” do nosso país em todas as suas decisões. E que se não for pedir muito que a ajude a ser uma boa presidente para o bem de toda uma nação com dimensões continentais.

A Hora da Estrela

Comemoração nas ruas de Natal, Rio Grande do Norte. Foto de Isaac Ribeiro com licença do Creative Commons AttributionShare Alike.

Por outro lado, Alane Virgínia concorda que a aprovação nas urnas da candidata indicada pelo presidente significa que a população aprovou a condução do governo de Lula, mas descarta a afirmação de que a população votou em Dilma só porque ela foi a protegida do presidente. Para a blogueira, o resultado mostra, na verdade, a vontade nacional de manter a esquerda no poder:

Votar em Dilma, no meu entendimento, tem a ver com a vontade de que a liderança do País continue na linha desenvolvida por Lula. Nossa opção foi correr mais um risco, foi votar acreditando que Dilma vai manter, na essência, o modelo de Governo de Lula.

Não, não acho que a população votou em uma desconhecida. Acho que a população votou em uma ideologia, ainda que fragilizada. É o voto de confiança.

Apesar das várias reflexões positivas e entusiasmadas quanto a eleição de Dilma, o Brasil foi entristecido pela onda de comentários xenófobicos que invadiu a rede ainda durante a apuração dos votos. Muitos eleitores insatisfeitos “culparam” pobres, nordestinos e pessoas com baixa escolaridade pelo resultado “desfavorável” da eleição. Lola Aronovich afirma que a raiz dessa reação foi a falta de amor pelo país na campanha adversária:

Um blog de extrema direita explicou a derrota de Serra através de inacreditáveis discursos racistas: a evolução dividiu o mundo em civilizados (europeus e estadunidenses brancos) e selvagens (africanos, indígenas e seus descendentes, que ele chama de botocudos). Nós brasileiros seríamos o lado do atraso, que tem um cérebro literalmente menor, segundo o fascistóide. E deveríamos copiar o sistema eleitoral americano, porque esse negócio de deixar a maioria eleger seu comandante só é legal quando a gente ganha. Outro blog pregou tolerância zero ao novo governo e desejou que a onda azul (qual onda azul, podemos nos perguntar) se transformasse num tsunami devastador. E já lançou seu grito de guerra, antes mesmo da presidenta tomar posse: “Fora Dilma!”.

Lidar com a desconfiança e o preconceito de parte da população e com a ferocidade de uma imprensa que tem se posicionado sempre do lado contrário será um dos desafios do Governo Dilma. Será que ela pode usar sua sensibilidade feminina para vencer isso? Eleitora da oposição, Conceição Duarte pede que, nessa jornada, a presidenta não se distraia com isso, nem esqueça que o Brasil “é grande, lindo e pródigo” e que todos os seus habitantes “são cheios de sonhos também”:

Essa gente, a nossa gente, quer saúde, paz, segurança, moradia, emprego. De quebra que venham as conduções mais fartas e melhor. O saneamento básico, os impostos mais baratos, as oportunidades para todos, a igualdade para a mulher quando trabalha ao lado do homem e ganha menos que ele. Escola, ensino de qualidade e tanto tanto mais para o nosso dia a dia. (…)
Como mulher com coração de mãe, de avó, desejo que ela tenha respeito pelos milhões de votos que teve.
Desejo sorte a ela. Saúde. E que não se esqueça de nós!

Uma semana depois das eleições, as blogueiras brasileiras continuam dizendo em coro: sim, ela pode.

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