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Brasil: “Tsunami” atinge duramente cidades do Nordeste

Categorias: América Latina, Brasil, Esforços Humanitários, Governança, Meio Ambiente, Mídia Cidadã

Pelo menos 46 pessoas morreram e centenas continuam desaparecidas desde sexta-feira, 18 de junho, após inundações torrenciais que varreram os estados nordestinos de Alagoas e Pernambuco, na pior tragédia ambiental da memória da população local. Apelidadas de o “tsunami nordestino”, as enchentes foram comparadas com catástrofes similares na Ásia, como o tsunami no Oceano Índico em 2004.

São pelo menos 180 mil pessoas desalojadas pelo desastre, sendo que muitas encontraram abrigo em escolas, igrejas ou na casa de parentes. A maioria das pessoas perdeu tudo que tinha e agora depende exclusivamente de ajuda humanitária. Com a demora na chegada da assistência, muitos estão passando fome e adoecendo.

De Santana do Mundaú, uma das mais atingidas pelas chuvas em Alagoas, um repórter cidadão filmou o momento em que a enchente invadiu a cidade [1], na última sexta-feira. O usuário do YouTube TheWelligton1 [2] fez as imagens de cima do telhado de sua casa:

Depois de ter perdido tudo, Teresa Aragão [3] publicou imagens da destruição ao seu redor e celebra o fato de estar viva, sã e salva, depois da maior catástrofe que já presenciou em sua cidade natal, Palmares (Pernambuco). Ela usa o próprio blog para divulgar notícias e coordenar doações para aqueles que precisam, com especial ênfase para pessoas especiais [4]:

A maior catástrofe que eu já presenciei aqui na minha cidade. a maior enchente de todos os tempos!!! Toda a minha família perdeu tudo!!!estamos sem roupas , documentos e sem remédios também.Graças a Deus não houve mortes na família. O desespero está grande , um verdadeiro caos de lama e amontoados,carros virados submersos…destruição total.

Branquinha, after the flood. Foto Marcelo Albuquerque, usada com permissão. [5]

Branquinha, depois da enchente. Foto Marcelo Albuquerque, usada com permissão.

De acordo com Gilvan Júnior [6], caiu o equivalente a um mês de chuva em menos de uma semana – Junho é normalmente a temporada de chuvas no Brasil, mas esse nível de precipitação não havia sido previsto:

Na capital alagoana, a expectativa era que chovesse 298,3 milímetros (mm) durante todo o mês, mas até ontem (22) foram registrados de 470,2 mm. Em Recife, choveu 456,7 mm até a manhã de hoje (23), enquanto eram esperados 388,9 mm em todo o mês.

Algumas cidades menores foram quase completamente destruídas pelas enchentes, enquanto comunidades inteiras às margens dos rios Mundaú e Capibaribe, em Alagoas e Pernambuco respectivamente, foram completamente arrastadas pelas águas. Pontes quebradas e estradas inundadas deixaram muitas cidades isoladas; não há energia elétrica, água potável ou serviços telefônicos em vários locais. Lays descreve a imagem desoladora em Alagoas [7], incluindo a  situação em Branquinha [8], uma das mais pobres cidades do país, que sofreu mais de 90% de destruição. O município precisará ser reconstruído em outro local:

Em cidades como Branquinha e Quebrangulo não restou um só prédio público de pé. Não há postos de saúde, mercadinhos ou farmácias que possam dar uma ajuda emergencial à população. Essas cidades terão que ser reconstruídas por completo, visto que também nenhuma documentação restou nos cartórios de registro públicos.

Quebrangulo [9]

"A estimativa é que 70% da Cidade de Quebrangulo, distante 115 km de Maceió, foi destruído pelas águas do rio Paraíba". Foto Marcelo Albuquerque, usada com permissão

A blogosfera ficou devastada pela notícia de enchentes dessa magnitude em uma área já castigada pela pobreza. Mas foi a informação de que as condições climáticas adversas não foram a causa principal do desastre e sim a destruição do meio-ambiente que deixou muitos enfurecidos. Alcides Faria [10] aproveitou a oportunidade para enviar um recado para um político local que adota políticas polêmicas na área de meio-ambiente:

Como todos sabem, o ocorrido em Alagoas também está relacionado ao desmatamento e à não proteção das microbacias. A vegetação marginal de córregos, lagoas e rios é essencial para conter o assoreamento e a crescida rápida do nível das águas.

Ruas debaixo d'água em Quebrangulo, Alagoas. Foto Marcelo Albuquerque, usada com permissão. [11]

Ruas debaixo d'água em Quebrangulo, Alagoas. Foto: Marcelo Albuquerque, sob autorização.

Muitos blogueiros publicaram informações sobre como ajudar. Redes de solidariedade começam a aparecer na internet e fora dela, como o SOS Alagoas [12], um site que usa o OpenStreetMaps para mapear as áreas mais afetadas e divulgar informações sobre pontos de coleta de donativos. Outros blogueiros se unem para fazer uma blogagem coletiva de emergência [13] com o objetivo de conscientizar a população sobre a necessidade e as maneiras de ajudar os necessitados.

Décio Junior [14] diz que as imagens da tragédia fazem com que ele se lembre do Tsunami na Indonésia e o terremoto no Haiti. No momento em que todos só pensam na Copa do Mundo na África do Sul, ele tenta capturar a atenção dos leitores para assuntos mais urgentes:

Mas não há diferença para a mãe natureza, não há hiato, não há desigualdade. A tragédia pode acontecer para John ou pra João.
E é uma pena ter que repetir esta retórica, mas preciso de alguma maneira contagiar todos os tocedores nesta corrente pelo Brasil.

Vamos juntos, tudo é um só coração, um só povo irmão. Pra frente Brasil, salve seus filhos, salve seus irmãos.

Linha férrea destruída pela enchente em Quebrangulo. Foto Marcelo Albuquerque, usada com permissão. [15]

Linha férrea destruída pela enchente em Quebrangulo. Foto Marcelo Albuquerque, usada com permissão

Depois de alguns dias de trégua, a chuvarada que assolou a região nos últimos dias ainda não chegou ao fim, pelo menos por enquanto. De acordo com o Serviço Nacional de Meteorologia, a previsão é de chuva para os próximos dias, o que poderá causar uma nova subida de rios e córregos na área e dificultar a chegada das equipes de resgate nas áreas afetadas.

As cidades alagadas ficam no nordeste do Brasil, uma região já castigada por níveis extremos de pobreza e normalmente afetada por clima extremamente árido e seca. Enchentes, no entanto, tornaram-se um desastre anual recorrente: em maio de 2009, pelo menos 44 pessoas morreram e 380 mil ficaram desabrigadas nas mesmas áreas.