Marrocos: O Legado de um Livre Pensador

Medersa por Piero Sierra no Flickr

A notícia da morte do filósofo e teórico social marroquino, Mohammed Abed al-Jabri, quase não recebeu qualquer atenção da mídia. No entanto, em décadas recentes, as contribuições de  al-Jabri para o debate entre a racionalidade e o pensamento religioso talvez não tenha, jamais, sido tão relevante quanto hoje em dia. Uma avalanche de elogios para o homem e seu trabalho aconteceram nas últimas semanas, mas se a morte, no início deste mês de um dos mais liberais pensadores árabes causou tal nível de expressão de empatia, também levou à revelação do lado vazio da intelectualidade árabe, profundamente dividida entre um liberalismo apaixonado e um conservadorismo estático. Nos websites da  blogosfera e de redes sociais, as reações ficaram separadas entre aqueles para quem o pensamento de Jabri ajudou a reconciliar a modernidade com a tradição e aqueles que vêem no trabalho do filósofo mais um ataque contra a autoridade religiosa. Aqui estão algumas das reações.

Abdeslam Ben Abdelali foi um dos alunos de al-Jabri. Escrevendo para o al-Awan, uma plataforma de blogs que se ocupam de filosofia e questões atuais, ele compartilha suas impressões sobre o falecido filósofo [ar]:

كان الجابري يعلم ] أنّ الوقت هو وقت زرع البذور. الا أنّ زرع البذور لا يمكن البتّة أن يتمّ من غير جذور ووعي تاريخيّ. لذا وجب علينا أن ننفتح على التراث، على تراثين: التراث العربي الاسلامي وكذا على التراث الانساني، الا أنّ كلّ تملّك لما يسمّى تراثا انسانيا لا بدّ أن يتمّ عبر خصوصية هي خصوصيتـ”نا”.

[Al-Jabri sabia] que era chegado o momento de semear. Entretanto, semear não pode simplesmente ocorrer sem se aprender sobre as raízes e sem se ter alguma consciência histórica. Sendo assim, temos que nos abrir para a tradição; para dois tipos de tradição: a tradição árabe-islâmica assim como a tradição humana. Apenas temos que ter consciência de que qualquer adoção de uma herança humanista tem que ser feita por meio de nossas próprias perspectivas singulares.

Mustafa Lemoueden bloga no SidiSlimane.com. Ele escreve [ar]:

لم يحدث أن تنازل الجابري يوما عن توجهه، وعن أفكاره، رغم كل الصعاب والعراقيل التي صافته، ومن ذلك طبعا عدم رضى بعضهم على كتباته التي تفتت الموروث الثقافي برمته، وقد انبرى بعض أشباه الكتاب للرد عنه ومحاولة دحض خلاصاته المخلخلة لعدد من المفاهيم، ومن المفجعات/المضحكات أن هناك جهات بالمشرق أفتت ب”هدر دمه”

Al-Jabri nunca hesitou em suas orientações ou ideias, apesar de todas as dificuldades e obstáculos, incluindo o desconforto que seus escritos podem ter causado a muitos, na medida que ele destruia meticulosamente toda a herança cultural. Tal fato permitiu a muitos pseudo-escritores tentar reagir a ele e recusar suas conclusões e conceitos desconcertantes. O ponto triste/irônico é que alguns grupos acabaram por emitir decretos clamando por seu sangue.

As reações vieram aos montes de toda a região. Mohammad Omar é um blogueiro jordaniano. Ele escreve [ar]:

[كنت أعيش في] حلقة مفرغة إذن، حلقة تدور حول نفسها تبحث عن إجابة السؤال “البسيط”، الذي طرح قبل 150 عاما، مع “بداية عصر النهضة العربية”، ويعاد طرحه يوميا منذ “خمسين عاما على هزيمة الثقافة العربية”،، لماذا تخلفنا وتقدم غيرنا؟…
بهذا السؤال بدأ الجابري مشروعه في نقد “العقل العربي”،،، وأسس لمفهوم “العقل المستقيل”،،،
عندما تعرفت على مؤلفات الجابري حينها، اختلفت كل نظرتي، لا بل وطريقة حياتي، فلم اعد ذاك الشاب الذي تكفيه النصوص وحفظها، ولا يكفيه الإعجاب بالجمل الثورية، وبالشخوص،،،
الجابري هو بداية رحلتي من اليقين إلى الشك، هو “لحظة وعي”، اشراقة،،،

[Eu vivia num] círculo vicioso, numa volta que se movimentava ao redor de si mesma procurando uma resposta àquela pergunta “simples” feita 150 anos atrás no “início da Renascença Árabe,” e que estamos sempre nos fazendo todos os dias desde “a derrota da cultura árabe” 50 anos atrás: por que outros avançam enquanto nós ficamos para trás?
Esta pergunta foi o ponto de início do projeto de al-Jabri para a análise crítica encontrada no “The Arab Mind” [A mente árabe, em inglês], e encontra-se na base de seu conceito: “a resignação da mente.”
Quando entrei em contato com o trabalho de al-Jabri pela primeira vez, mudei minhas opiniões, e mesmo meu estilo de vida, completamente. Não mais era aquele jovem que meramente lia e memorizava alguns textos ou que ficava satisfeito com a simples admiração por frases ou personalidades revolucionárias.
Al-Jabri é o começo de minha jornada da certeza para a dúvida. É o meu momento de conscientização; uma iluminação.

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