Uganda: Blogueiros discutem projeto de lei anti-gay

O projeto de lei anti-gay ugandês foi apresentado ao parlamento e agora espera a assinatura do presidente Yoweri Museveni para tornar a homossexualidade oficialmente ilegal. O código anterior não era claro, mas agora o projeto, chamado de “Projeto de Lei Anti-Homossexualidade 2009″ apresentado pelo parlamentar David Bahati declara qualquer ato ou tendência homossexual passível de pena de morte ou prisão. O blogueiro gay-ugandan (gug) do blog The Ugandan [en] escreve:

The multiple laws that I will be breaking as soon as the president signs this law. Well, our detractors had already said that we would be stiffed with a tougher law, but this goes way beyond that. If I attempt to commit the offense… (god, the number of times that I have made passes and they have been rejected!) Each of those times was worth 7 years in jail. Good heavens!!!! Before, we could be liable to life imprisonment. gug hereby declares that, when the President of the Republic signs this law, gug will be liable to the death penalty… because I and my lover are serial offenders, breaking this law.

Vou quebrar tantas leis assim que o presidente assinar essa lei. Bem, nossos detratores já haviam dito que seríamos encurralados por uma lei mais severa, mas essa passa dos limites. Se eu tentar cometer a ofensa… (meu deus, o número de vezes em que eu fiz tentativas, mas elas foram rejeitadas!) Cada uma daquelas vezes valia 7 anos na cadeia. Céus! Antes, éramos sujeitos à prisão. O gug aqui declara que, quando o Presidente da República assinar a lei, ele estará sujeito à pena de morte… pois eu e meu amante somos infratores em série quebrando essa lei.
Mais adiante, o projeto de lei proíbe a adoção por casais gays. Qualquer pessoa que ajude, promova ou aconselhe qualquer ato homossexual poderá pegar até sete anos de prisão ou o risco de fiança de 100m xelins (aproximadamente R$ 91 mil). O projeto aponta os efeitos nocivos da homossexualidade da seguinte forma:

Research indicates that the homosexuality has a variety of negative consequences including higher incidences of violence, sexually transmitted diseases, and use of drugs. The higher incidence of separation and break-up in homosexual relationships also creates a highly unstable environment for children raised by homosexuals through adoption or otherwise, and can have profound psychological consequences on those children. In addition, the promotion of homosexual behavior undermines our traditional family values.
Given Uganda’s historical, legal, cultural and religious values which maintain that the family, based on marriage between a man and a woman is the basic unit of society. This Bill aims at strengthening the nation’s capacity to deal with emerging internal and external threats to the traditional heterosexual family. These threats include: redefining human rights to elevate homosexual and transgender behavior as legally protected categories of people.
There is also need to protect our children and youths who are made vulnerable to sexual abuse and deviation as a result of cultural changes, uncensored information technologies, parentless child developmental settings and increasing attempts by homosexuals to raise children in homosexual relationships through adoption, foster care, or otherwise.

Pesquisas indicam que a homossexualidade provoca maior incidência de violência, doenças sexualmente transmissíveis e o uso de drogas. A maior incidência de separações em relacionamentos homossexuais também cria um ambiente altamente instável a crianças criadas por homossexuais pela adoção ou de outra maneira e pode causar conseqüências psicológicas profundas nessas crianças. Ademais, a promoção do comportamento homossexual mina os valores de nossa família tradicional.
Os valores históricos, legais, culturais e religiosos de Uganda  afirmam que a família, baseada no casamento entre um homem e uma mulher, é a unidade básica da sociedade. Esse projeto de lei pretende fortalecer a capacidade da nação de lidar com ameaças insurgentes internas ou externas à família heterossexual tradicional. Essas ameaças incluem: redefinir os direitos humanos para elevar o comportamento homossexual ou transgênero como categorias de pessoas legalmente protegidas .
Há também uma necessidade de proteger nossas crianças e jovens que estão vulneráveis ao abuso sexual e desvio como resultado das mudanças culturais, tecnologias de informação sem censura, padrões de criação de crianças sem pais e o aumento de tentativas de adoção por casais homossexuais, assistência social, entre outros.

Produtores, editores e distribuidores de material contendo homossexualidade, especialmente se for lucrativo, e ONGs terão seu certificado ou registro cancelados e o diretor da instituição estará sujeito a sete anos de prisão. Isso inclui blogs gays em Uganda:

Poor sympathizers. You are not left to love us. No, all lovers of gays, and gays in Uganda will suffer, and be punished by this law. Any press conferences? Not by gay Ugandans. You see, we are a pariah people that will never be like all other Ugandans. Ha ha ha ha ha!
Oh, the gayuganda blog is one of the things which are illegal, as per that bill. I am furiously promoting homosexuality on this blog, complaining about a law like this. So, 5 years in prison, and my (non existent) bank balance will be set back by 100M Uganda shillings…! And the people who dare to give us condoms and lubricant for sex… Or, if you dare to have an HIV prevention program for homosexuals in Uganda… or even try to teach safer sex. Well, the penalties are stiff. Very stiff. Jail, and jail and other things.

Pobres simpatizantes. Vocês não foram poupados. Não, todos os simpatizantes e gays de Uganda vão sofrer e serão punidos por essa lei. Alguma conferência da imprensa? Não dos ugandeses gays. Vejam vocês, somos os párias que nunca serão como os outros ugandeses. Ha ha ha ha ha!

E o blog gayuganda é uma das coisas ilegais de acordo com o projeto de lei. Estou promovendo a homossexualidade furiosamente neste blog, protestando contra uma lei como essa. Então, 5 anos de prisão e meu saldo bancário voltará aos 100m xelins ugandeses! E aqueles que se atrevem a nos dar preservativos e lubrificantes… ou aqueles que se atrevem a ter um programa de prevenção de HIV para homossexuais em Uganda… ou mesmo aqueles que tentam instruir sobre o sexo seguro. É, as penas são severas. Bem severas. Cadeia, cadeia, entre outras coisas.

Eis os objetivos do projeto de lei:

3.1. The objectives of the Bill

The objectives of the Bill are:

(a) To protect marriage as that only between a man and a woman in Uganda;

(b) To prohibit homosexual behavior and related practices in Uganda as they constitute a threat to the traditional family;

(c) To safeguard the health of Ugandan citizens from the negative effects of homosexuality and related practices;

(d) To establish progressive legislation protective of the traditional family that can serve as a model for other countries;

(e) To prohibit ratification of any international treaties, conventions, protocols and declarations which are contrary or inconsistent with the provisions of this Act;

(f) To ensure that no international instruments to which Uganda is already a party can be interpreted or applied in Uganda in a way that was never intended at the time the document was created;

(e) To withdraw from any international agreements to which Uganda already is a party, or file reservations to them, which are re-interpreted to include protection for homosexual behavior, or that promote same-sex marriage, or that call for the promotion or teaching about homosexuality as being healthy, normal, or an acceptable lifestyle choice, or that seek to establish sexual behavior, sexual orientation, or gender identity, or sexual minorities as legally protected categories of people; and

(f) To prohibit Uganda from becoming a party to any new international instruments that expressly include protection for homosexual behavior; promote same-sex marriage; call for the promotion or teaching about homosexuality or homosexual relations as being healthy, normal, or an acceptable lifestyle choice; and/or seek to establish sexual behavior, sexual orientation, gender identity or sexual minorities as legally protected categories of people

3.1 Objetivos do Projeto de Lei
Os objetivos do Projeto de Lei são:

(a) Proteger o casamento como sendo apenas aquele entre um homem e uma mulher em Uganda;

(b) Proibir comportamento homossexual e práticas correlatas em Uganda uma vez que constituem uma ameaça para a família tradicional;

(c) Salvaguardar a saúde dos cidadãos ugandeses contra os efeitos negativos da homossexualidade e práticas correlatas;

(d) Estabelecer uma legislação progressiva defensora da família tradicional que sirva de modelo a outros países;

(e) Proibir a ratificação de quaisquer tratados internacionais, convenções, protocolos e declarações que sejam contrários ou inconsistentes com as disposições deste Ato;

(f) Assegurar que nenhum instrumento internacional do qual Uganda já faça parte possa ser interpretado ou aplicado em Uganda fora das intenções de quando foi criado o documento;

(g) Cancelar a participação de Uganda em quaisquer acordos internacionais, ou reservas de arquivos desses, que sejam reinterpretados para incluir proteção ao comportamento homossexual ou que promova casamento entre pessoas de mesmo sexo ou com apelos à promoção ou ensino sobre a homossexualidade como ato saudável, normal ou como estilo de vida aceitável ou que busquem estabelecer um comportamento, orientação sexual ou identidade de gênero ou minorias sexuais como categorias de pessoas legalmente protegidas; e

(h) Proibir Uganda de participar de qualquer novo instrumento internacional que inclua expressamente o comportamento homossexual; promova casamento entre pessoas de mesmo sexo; exija a promoção ou ensino sobre homossexualidade ou relações homossexuais como práticas saudáveis, normais ou estilo de vida aceitável; e/ou busque estabelecer comportamento ou orientação sexual, identidade de gênero ou minorias sexuais como categorias de pessoas protegidas.

O blog Gay Ugandan insiste que tomem a causa com ele e pergunta se ele merece morrer por causa disso:

If you are outside the country, why, that is very good. Your congregation can be made aware of all the good things that some Christians in Uganda wish some sinners called gay Ugandans. I am sure your outrage will help. A letter, a protest match, questions to leaders of Uganda, religious and otherwise traveling outside the country. This is a moral question, how can they justify killing me because I am gay, living in a gay relationship with another gay man?

# Ok, what of gay people in other countries. You are our friends. Yes, we dare to ask our gay brothers and sisters for help, especially when our countrymates believe we should be patriotic enough to ‘die’ in the name of their moral uprightness, for god and country.
Tell your local gay group about it.
Organise protests, big and small. Educate any who doesnt know about it.
Write letters of protest. Be courteous, (the framer of the bill says that we homosexuals want to kill him. He says we have already written him ‘threatening’ letters.)

Se você está fora do país, bom para você. Sua congregação pode ficar informada sobre todas as coisas boas que alguns cristãos de Uganda desejam aos pecadores chamados gays de Uganda. Estou certo de que sua indignação vai nos ajudar. Uma carta, uma marcha de protesto, uma lista de perguntas aos líderes ugandeses religiosos e outros viajando fora do país. É uma questão moral. Como podem justificar minha morte por eu ser gay e ter um relacionamento gay?

#Então, quanto aos gays de outros países, vocês são nossos amigos. Sim, atrevemo-nos a pedir ajuda a nossos irmãos e irmãs gays, principalmente se nossos conterrâneos acreditam que deveríamos ser patriotas o bastante para ‘morrer’ pela sua retidão moral, por seu deus e pelo país.

Fale sobre isso com seu grupo gay local. Organize protestos pequenos ou grandes. Instruam aqueles que não sabem nada sobre, escrevam cartas de protesto, sejam corteses (o organizador do projeto de lei diz que nós homossexuais queremos matá-lo e que ele recebeu ‘cartas de ameaça’.)

Afrogay [en], outro blog ugandês, compara o governo de Uganda aos nazistas, dizendo que a hora de dar o sinal de parar é agora:

Again, as I have argued here and elsewhere, we are best advised to keep our powder dry for the real battle if the bill is ever passed and signed into law. So, I for one don't plan on saying too much about the nuts and bolts of what is wrong with it. And the reason is simple: if we point out what is wrong with it now, our detractors will use what we say to clean up the bill. Best then to shout foul as loud as we can on the discriminatory elements of the bill without guiding them around the glaring technical, legal, constitutional and human rights minefield they are sleep-walking towards with this bill.

Mais uma vez, como argumentei aqui e em outros lugares, somos aconselhados a economizar esforços para a verdadeira batalha se esse projeto for assinado. Por isso, não pretendo falar sozinho do que há de errado no projeto. O motivo é simples: se apontarmos o que há de errado, nossos detratores usarão o que dissemos para por o projeto em ordem. O melhor seria praguejar o mais alto que pudermos contra os elementos discriminatórios desse projeto de lei sem guiá-los no âmbito técnico, legal, constitucional e no campo minado dos direitos humanos por onde andam como sonâmbulos.”

Um blogueiro nigeriano, Anengiyefa, acha que o projeto de lei tem falhas e que o painel que o fez ignora o que é a homossexualidade. Ele diz que a homossexualidade não pode ser uma ofensa, que não se pode punir alguém por ter sentimentos sexuais por outra pessoa:

“Mr Bahati goes on to demand the death penalty for what he calls “aggravated homosexuality”. I read this and I wondered if the said Mr Bahati has ever had the opportunity to sit inside a classroom in his life, given that unless he is starkly illiterate, he ought to know that there are no law books in any Common Law jurisdiction, (including Uganda), that refer to an offense known as ‘homosexuality’. Homosexuality cannot be an offense! You cannot make it an offense and punish a person for having feelings of sexual and emotional attraction towards others of the same gender. You cannot prove ‘homosexuality’ in a court of law to the standard of proof that is required in a criminal court.”

O Sr. Bahati continua a exigir pena de morte para o que ele considera “homossexualidade provocada”. Li isso e pensei se o dito Sr. Bahati sentou numa sala de aula alguma vez na vida, já que, a não ser que seja decididamente analfabeto, ele tem a obrigação de saber que não existe qualquer livro de direito em qualquer jurisdição de direito comum (incluindo em Uganda) que faça referência a uma ofensa chamada “homossexualidade”. Homossexualidade não pode ser considerada ofensa! Não podem torná-la uma ofensa e punir alguém por sentir atração emotiva e sexual por outro do mesmo sexo. Não se pode provar ‘homossexualidade’ numa corte para o nível de evidência como exigido numa corte criminal.

Anengiyefa percebe que Uganda acabou de ver a hipocrisia dos membros do parlamento que se uniram e estão prestes a passar a lei vitimizando a homossexualidade em nome da moralidade: isso mostra por que o sistema está tão ansioso para criminalizar o sexo consensual entre dois adultos do mesmo sexo, omitindo questões importantes como violência étnica, tribalismo, AIDS, estupro de crianças etc:

This outbreak of frenzied homophobia is the epitome of the hypocrisy that pervades political life in Africa. At a time when expensive legislative time should be judiciously expended on the issues that really matter to the people of the country; when Ugandan lawmakers and the Ugandan government should be concerned about the welfare of vulnerable Ugandans, (including those same-gender loving men and women in their society, who are susceptible to wanton physical abuse and discrimination); when the Ugandan authorities should be looking to protect those of the country's citizens whose welfare is their responsibility; when the challenges that face our continent in this 21st Century are enormous; what we hear of instead is an Anti-Homosexuality Bill being introduced to Parliament. This bill is deemed necessary according to the MP David Bahati who introduced it. He claims that the purpose of the bill is to protect children and the ‘traditional family’.

Esse surto de homofobia frenética é a epítome da hipocrisia que impregna a vida política na África. Quando o valioso tempo legislativo deveria ser gasto judicialmente nos problemas que realmente importam ao povo, quando os legisladores e o governo de Uganda deveria estar preocupado com o bem-estar de ugandeses vulneráveis (incluindo homossexuais que são suscetíveis a discriminação e abuso físico injustificados), quando autoridades ugandesas deveriam estar buscando proteger os cidadãos, cujo bem-estar é responsabilidade deles, quando os desafios que encaram nosso continente no século 21 são enormes; o que recebemos, ao invés disso, é um projeto de lei Anti-Homossexuais no parlamento. De acordo com David Bahati, que sugeriu o projeto de lei, ele é necessário para proteger as crianças e a dita ‘família tradicional’.

8 comentários

  • […] from: Global Voices em Português este artigo não terá comentários | e-mail ao autor | subscreva o blog via feed RSS | […]

  • no mínimo isso é absurdo. se com o vácuo da lei a violência é absurda, imagine com a aval dela. isso não é evolução.

    legalizar a discriminação é burrice. que no brasil se aprove a a criminalização da homofobia .

  • […] > Uganda: Blogueiros discutem projeto de lei anti-gay […]

  • julio cavalcante

    é simplesmente lamentavel, que um Pais como uganda do continente africano , um continente tão sacrificado historicamente queira aprovar uma lei tão absurda, como essa lei anti-homosseualismo , isso é tão absurdo e tão desprovido de fundamento , que torna-se inacreditavel , eu lamento , lamento e lamento que deus tenha misericordia e compaixão desse povo

  • João Alfredo

    tá de parabéns este país!!!!, tomara que um dia todos os países do mundo façam o mesmo!!! assim quem sabe o mundo poderá ter finalmente um pouco de decência e honra coisa que anda falta, principalmente num país como o Brasil!!

    • Discordo de você, João. Atentar contra a vida de outrem é uma violação dos Direitos Humanos. Só porque uma pessoa é gay não significa que ela deveria ser levada à morte. É uma orientação desta pessoa e concerne somente a vida privada dela. Não tem nada a ver com “decência” ou “honra” de uma nação. Repense suas indagações. =)

      • amadeu

        creio que o amigo está um tanto equivocado quanto a sua colocação, e já que estamos falando em direitos humanos o que em muitos caso e por causa dos direitos humanos e por as pessoas não saberem exatamente o queé “ireitos humanos”, pois muitos pensam qualquer baboseira em nome dos direitos humanos e querem se esconder por trás desse tão propalado direitos humanos que chegam a esquecer dos direitos de outros não serem atingidos por causa dos “direitos humanos meus, isto é se eu penso que posso viver de um determinado modo não interessa que prejuízos isso possa causar a outrem, pois os “meus” direitos humanos me imunizam comrtra o que outros acham que é errado eu fazer. esse é o caso do movimento “LGBTS” se não acresentaram mais alguma sigla esqueçem que outros tem o direito à vida mesmo que isso me impeça de me divertir com o azar de outro.é verdade que devemos respeito indistintamente a quem quer que seja, não aceitar que a conduta de oiutrem nos prejudiquem e venha contra nossa consciência.

  • gilberto

    que idéia de cristianismo vocês meus irmãos tem?
    o melhor exemplo de cristão é CRISTO ELE não faria uma lei para matar ninguém e nem teria raiva de pessoas gay, leiam os evangelios antes de falar de cristãos pois esses uganenses que querem matar NÃO são cristãos

Cancelar esta resposta

Junte-se à conversa -> julio cavalcante

Colaboradores, favor realizar Entrar »

Por uma boa conversa...

  • Por favor, trate as outras pessoas com respeito. Trate como deseja ser tratado. Comentários que contenham mensagens de ódio, linguagem inadequada ou ataques pessoais não serão aprovados. Seja razoável.