Brasil: Diálogos amplificados na luta contra o Projeto Azeredo

Arte: Luciano Matsuzaki e Mariana Lettis

Arte: Luciano Matsuzaki e Mariana Lettis

Em 14 de Maio ocorreu em São Paulo um protesto – em uma iniciativa de debate – contra o Projeto de Lei de Crimes Digitais, proposto pelo Senador Azeredo (PSDB-MG), que objetiva tipificar crimes na Internet.  No dia 25 de Maio foi a vez de uma manifestação em Porto Alegre. Já em 1 de Junho um protesto de mesma ordem aconteceu em Minas Gerais, na medida em que há outro sendo planejado para acontecer no Rio de Janeiro.

Estes protestos são chamados de “Contra o AI-5 Digital” por causa do Ato Constitucional 5, ou “AI-5“, da ditadura militar brasileira. O ato foi considerado o mais cruel dos 17 atos passados pela ditadura militar após o golpe de Estado em 1964. Outorgado em 1968, o AI-5 aboliu a liberdade de expressão ao introduzir uma censura preliminar em músicas, filmes, teatro e televisão. Qualquer obra considerada subversiva aos valores morais e políticos nacionais era censurada e os levados à prisão. O AI-5 marcou a transição para o período mais difícil em se tratando de violação de direitos humanos na história do Brasil.

Por todo o país, mobilizações contra o projeto proposto são organizadas por um grupo de blogueiros, que criaram um manifesto, uma conta no Twitter e o blog Mega Não, este último criado com o único objetivo de reunir informações acerca do fato e contribuir para esclarecer dúvidas sobre o que este projeto pode significar para os usuários de Internet no país:

A proposta do Mega Não, é ser um meta manifesto, um agregador de informações e de diversas manifestações na Internet e fora dela, com o objetivo de combater o vigilantismo. Diversos núcleos ciberativistas estão surgindo e aumentando o discurso e a pressão popular contra o vigilantismo, tenta agregar, fomentar e ajudar a divulgar estes eventos é a nossa proposta, nos informe de seus movimentos, vamos juntar forças!!!

Uma petição online contra o Projeto de Crimes Digitais, lançada em 2008, já reune mais de 140 mil assinaturas. Usuários do Orkut, uma das mais populares redes sociais online no Brasil também entraram nessa luta, já que muitos dos anseios desse projeto está relacionada à essa rede social. Das várias comunidades, “Não ao projeto Azeredo” já alcançou 6.563 membros.

Ativistas também usam o Twitter como uma ferramenta de informação para seus encontros e para blogagem colaborativa sobre o assunto: as hashtags #meganao e #ai5digital são comumente usadas pelos blogueiros e twitteres e representam uma fonte de informação para os que buscam atualizações sobre como contribuir para a campanha. Além disso, muitos dos organizadores das manifestações, adeptos e entusiastas também podem ser encontrados no Twitter, tal qual @caribe, @pauloteixeira13, @samadeu, @_arles e @myris. Para se manterem atualizados acerca da repercussão das manifestações e do Projeto de Lei Azeredo, usuários utilizam o Delicious e seu sistema de favoritos e tags para concentrar a informação em um só lugar.

"Não, Azeredo", em São Paulo. Foto por Andre Deak, publicado sobre uma licença Creative Commons.

"Não, Azeredo", em São Paulo. Foto por Andre Deak, publicado sobre uma licença Creative Commons.

Outro fato interessante é a ausência da mídia de massa em cobrir satisfatoriamente a situação. Para muitos blogueiros brasileiros e usuários da Internet, a impressão é de que as empresas de mídia, além dos provedores de Internet e o governo, estão ansiosos pela aprovação do projeto, pois assim exerceriam controle sobre o que as pessoas dizem e fazem por toda a Rede. Antonio Arles (@_arles) comenta em seu blog sobre o caso e salienta a utilidade da Internet em reunir informações sobre os protestos:

Participei (presencialmente ou via Internet) de pelo menos três atos este ano em que a Rede foi importante para a organização, difusão e transmissão: o Ato contra a “Ditabranda” da Folha, o Saia Gilmar [um protesto pedindo ao presidente do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes que renunciasse o cargo] o Ato Contra o AI-5 Digital. E é justamente essa possibilidade de exercício da cidadania um dos motivos da adesão dos oligopólios midiáticos ao AI-5 Digital. A lógica é a mesma da dos órgãos de repressão do Império Soviético ou da Ditadura Civil-Militar Brasileira. Apesar de usaram a máscara de “democratas” – usando argumentos como o da liberdade quando seus interesses estão em jogo, tentando confundir “liberdade de imprensa” com “liberdade da empresa” -, os oligopólios midiáticos são fruto de uma ditadura. Em última análise, são uma das faces da Ditadura Civil-Militar que continuam vivas depois da redemocratização. A questão é que, para além dos interesses econômicos, a tentativa de criminalização e de aprofundar vigilantismo na Internet é uma tentativa de manutenção do monopólio da informação/opinião e, conseqüentemente, do poder.

Protesto em São Paulo. Foto por Andre Deak, publicada sobre uma licença Creative Commons.

Protesto em São Paulo. Foto por Andre Deak, publicada sobre uma licença Creative Commons.

Se esse projeto será ou não consolidado, o alvo das autoridades brasileiras parece ser a satisfação das empresas de direitos autoriais internacionais. Em entrevista ao blog Observatório do Direito à Comunicação, Paulo Teixeira, PT, deputado por São Paulo, salienta:

Ele pretende (o Projeto de Lei Azeredo), em primeiro lugar, introduzir no Brasil uma coisa que alguns países estão introduzindo e que no Brasil, na minha opinião, nós não deveríamos permitir que se introduzisse. Ele está querendo introduzir os mecanismos de controle da internet para a garantia do direito autoral.

Foto por @marioamaya

Foto por @marioamaya

O Projeto de Lei de Crimes Digitais já foi discutido em artigos anteriores no Global Voices Online. A iniciativa agora é reservada aos ativistas, ciberativistas e usuários da Internet para lutar contra tal projeto com ainda mais força. Caso contrário, a Internet brasileira pode se tornar um lugar onde as pessoas serão culpadas antes mesmo de saberem os motivos de serem acusadas.

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