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Brasil: Chuvas deixam mais de 80 mortos e milhares de desabrigados no Sul

Categorias: América Latina, Brasil, Desastre, Esforços Humanitários, Governança, Meio Ambiente, Tecnologia

Mais de 80 pessoas morreram por conta de deslizamentos de terra e enchentes causados pelas fortes chuvas [1] no estado de Santa Catarina [2], na Região Sul [3] do Brasil, e a lista de mortos não parou de aumentar enquanto as equipes de resgate realizam buscas nos escombros deixados pelas enchentes que começaram no fim de semana. Até este momento, acredita-se que mais de um milhão e meio de pessoas tenham sido afetadas, e aproximadamente 160 mil pessoas estão sem eletricidade. Não há água potável também, e a fome começa a atingir os desabrigados. Muitas das estradas da região foram bloqueadas pela lama e pela água e oito cidades ficaram ilhadas pelas águas das enchentes.

O governo federal providenciou ajuda enviando helicópteros e barcos para tentar alcançar os moradores presos em suas casas, e outros estados brasileiros estão enviando ajuda, incluindo roupas e alimentos. O estado de Santa Catarina declarou estado de emergência. Esta já foi declarada como a pior tragédia ambiental do Brasil, e a estação das chuvas está apenas começando. Robson Souza [4] [Pt] tirou muitas fotografias com seu telefone celular e as publicou em seu blogue. Elas mostram a situação da cidade de Itajaí [5] entre as 5:20 e as 15:30, horário local, no dia 24 de novembro:

[4]

Mais de 50 mil pessoas ficaram desabrigadas depois das chuvas do final de semana, que destruíram 20 mil casas. Algumas delas estão agora vivendo em abrigos improvisados pelas autoridades locais. Rogério Christofoletti [6] [Pt], também de Itajaí, é uma das 20 mil pessoas abrigadas em casas de amigos:

Cerca de 80% da cidade de Itajaí está sob as águas, e todas as classes sociais estão atingidas. Dos miseráveis aos ricaços, ninguém foi poupado. Mesmo quem não foi diretamente atingido está sofrendo as conseqüências: veja o caso dos meus amigos Isaías e Raquel, que acolheram a minha família e mais outras duas em seu apartamento. A cidade deve sofrer nas próximas horas com falta de água, alimentos, combustíveis… Boa parte da cidade, metade dela, está sem energia elétrica. Deixei minha casa, e depois conferi que cerca de 30 ou 40 cm de água havia invadido o local. Não pude permanecer lá. Saí no domingo de manhã, antes mesmo da água chegar. Fui com mulher e filho para um local seguro, e em seguida, fomos auxiliar no Colégio Dom Bosco, onde centenas de pessoas chegavam molhadas, com frio, com fome, e sem nenhuma esperança. Perderam tudo. Distribuindo roupas para as pessoas, eu via nos olhos delas um misto de vergonha, de desalento, de perplexidade. Um sofrimento intenso, difícil de escrever aqui.

Coré [7] [Pt], da região turística praiana do Balneário Camboriú [8], foi trabalhar normalmente no final de semana, apenas para descobrir mais tarde quão grave era a situação:

Ao chegar lá a loja estava vazia, e ficou assim boa parte do tempo até começarem a chegar os primeiros “sobreviventes” das enchentes – pessoas simples que perderam tudo e foram retirados de barco pela defesa civil. Na hora tive que manter o jogo de cintura e continuar a sorrir, por mais que todas as pessoas com quem trabalho ficassem com aquela cara de “mas eim?” ou “que absurdo!” porém no fundo cada pessoa que entrava na loja era um pedaço do meu coração que quebrava, cada centavo que eles gastavam na expectativa de começar tudo do zero era uma lágrima que eu queria que caisse do meu rosto. No entando continuei ali, sorrindo.

Gambá [9] [Pt] de Blumenau [10] está tentando voltar à vida normal:

É assim mesmo. Depois que as águas baixam, começa imediatamente o trabalho de limpeza. Uma tarefa difícil que requer muito esforço físico e controle emocional. Primeiro a retirada da lama acumulada (mais ou menos 20 cm), ver o que pode ser lavado, reaproveitado, esperar secar e recolocar tudo no lugar. Como ainda não temos água nas torneiras, hoje passei o dia desmontando o que restou dessa garagem aí em cima. Tô morto de cansado. E amanhã tem mais. Muito mais.

A foto acima foi tirada por Rodrigo Stulzer [11] [Pt], que estava passando o final de semana em Santa Catarina e documentou as enchentes. Elas o lembraram de outro feriado passado por ele no estado, quando ainda era uma criança:

Eu já havia pego em 1983 uma grande enchente em Santa Catarina. Estávamos eu e minha mãe, de barraca, em Balneário Camboriú. Os primeiros dias foram muito legais. Íamos para a praia de dia e à noite eu brincava com as outras crianças do camping. Joguei muitas partidas de War naquelas férias. Mas daí a chuva começou… e não parou mais. Acabamos ilhados no camping e conseguimos ir até a casa de uma amiga, depois que a água baixou um pouco. O desespero bateu quando a água quase entrou no banheiro do camping, onde estávamos, junto com as outras pessoas. Eu tinha 12 anos e chorei de medo. Back to 2008 e eu agora casado e com um filho de 6 anos. Os tempos mudam mas a natureza continua a mesma.

Muitos novos blogues e iniciativas de jornalismo cidadão foram colocadas rapidamente no ar neste momento de tragédia. A prefeitura municipal de Itajaí dediciu criar um blogue de último minuto [12], com atualizações sobre as chuvas fortes na cidade. Também de Itajaí, o Blog dos Desabrigados [13] tem um sistema de busca onde as pessoas podem descobrir onde seus amigos ou parentes foram abrigados, e onde pessoas em busca de informações sobre entes queridos desaparecidos podem encontrar informações. Uma rede de apoio voluntária também foi criada no blogue Arca de Noé [14], para onde pessoas podem enviar fotos [15] e vídeos [16], dar notícias sobre a situação em suas vizinhanças ou lugares específicos, e também descobrir formas de ajudar e oportunidades de voluntariado. Um dos tags de twitter sobre as chuvas em Santa Catarina é #SC [17].