“O maior fenômeno de anti-jornalismo dos últimos anos foi o que ocorreu com a revista Veja. Gradativamente, o maior semanário brasileiro foi se transformando em um pasquim sem compromisso com o jornalismo, recorrendo a ataques desqualificadores contra quem atravessasse seu caminho, envolvendo-se em guerras comerciais e aceitando que suas páginas e sites abrigassem matérias e colunas do mais puro esgoto jornalístico”. Luis Nassif introduz a investigação que fez sobre o que aconteceu com a maior revista semanal do paísl.
1 comentário
Caros,
Segue cópia de e-mail que enviei ao blog de Luiz Nassif, a respeito da crônica ‘Os momentos de catarse e a mídia’, de 30 de janeiro de 2008 – por vocês reproduzida.
Espero que possam publicá-la, para bem informar seus leitores.
Grata pela atenção
Eliana Simonetti
Caro Nassif,
acabo de ler sua crônica, ‘Os momentos de catarse e a mídia’, de 30 de janeiro de 2008. Há mais de seis anos não leio a revista Veja e me foi bastante instrutivo saber da decadência da publicação. Concordo com sua explicação sobre as razões do anti-jornalismo – jornalismo e os negócios e uso de notas como ferramenta para disputas empresariais e jurídicas, inclusive.
No caso, entretanto, outros pontos me chamaram a atenção, por dizerem respeito à minha pessoa. Ocorre que minha pessoa, como diria Madame Satã, tem estado bastante distante dos holofotes há anos para, de um momento para outro, surgir de maneira meio enviesada em seu blog – em texto reproduzido em tantos outros sites. Isso não faz bem à minha alma, à minha saúde, acho que a nada e a ninguém. Então resolvi lhe escrever.
O primeiro ponto que me perturba: meu nome não foi citado. Como não compreendo a razão, e não tenho o que esconder, aqui vai: a editora de economia de Veja demitida em novembro de 2001 sob a acusação de ter relações impróprias com o lobista Alexandre Paes dos Santos fui eu, Eliana Giannella Simonetti, jornalista há quase 30 anos, com trabalhos investigativos, analíticos, econômicos, culturais, entre outros, elogiados e reproduzidos no Brasil e no exterior.
Você sabe, como eu, que quando um jornalista tem acesso a documentos e informações, deve checá-los, buscar fontes alternativas, sentir-se razoavelmente seguro antes de encaminhar uma proposta de reportagem. Daí meu segundo incômodo: a alusão a jornalistas que funcionam como leva-e-traz, carregadores de dossiês de lobistas. Não estou entre eles. Nunca estive. Se eles existem, talvez esteja aí uma explicação para a decadência de Veja e de outros meios de comunicação. Da perda de credibilidade.
Poderíamos falar, aqui, sobre a relação entre o poder e a imprensa – donos de meios de comunicação, velhos jornalistas experientes e focas principiantes de um lado; políticos e empresários de outro. Essa relação tem traços de promiscuidade desde a origem da imprensa.
Da mesma forma, podemos falar sobre lobistas, intermediários que se especializam em adquirir acesso a pessoas-chave para defenderem interesses (escusos ou não). Traficam influência.
Reportagens, como sabemos, nascem e se desenrolam das mais diversas maneiras. Muitos anos atrás, ouvi de um alto funcionário da Receita Federal um relato que me custou viagens, inúmeras entrevistas, um esforço enorme e nenhuma matéria: a denúncia não se comprovou. Passado pouco tempo, elaborei um trabalho inovador depois de um final de semana em que fiquei observando meus filhos conversarem e brincarem – e produzirem raciocínios diferentes dos meus. Não houve lobista ou informante algum nesse último caso, e a reportagem sobre o cérebro das crianças teve grande repercussão entre os leitores de Veja.
Ao longo de minha carreira, tive contato com inúmeros lobistas – alguns mais, outros menos confiáveis. Houve histórias de intrigas no seio de famílias tradicionais e conhecidas que me foram passadas por esses profissionais. Atendi lobistas que trabalham em favor da melhoria da educação pública. São apenas dois exemplos. Em ambos os casos as notícias publicadas não trouxeram lucro a quem me trouxe a informação disparadora da reportagem – ao menos que eu saiba.
Movo dois processos judiciais contra a Editora Abril. Um deles, trabalhista, dá conta de que nos dez anos em que estive no quadro de jornalistas da revista Veja trabalhei em média 12 horas por dia, sem horário para refeições – quando o contrato me pagava por sete horas de serviço. Isso para ficar apenas num item. Estou entre os poucos profissionais de imprensa que acionam a Editora Abril, quase onipotente no mercado brasileiro.
A segunda ação é relativa aos danos morais que sofri. Pelo fato de a revista Veja ter publicado nota justificando minha demissão – que, diga-se, foi sem justa causa.
O Sistema Judiciário é lento, mas os processos têm caminhado a meu favor. E espero que Veja continue em circulação quando for obrigada a publicar a retratação da nota que prejudicou minha vida e a de minha família.
Em tempo: não fui eu quem mais publicou denúncias fornecidas por Alexandre Paes dos Santos. Nem foi ele meu principal informante nos dez anos em que trabalhei em Veja. Para realizar o trabalho que realizei, contei com o suporte de muitos detentores de informações, pessoas com histórias bem documentadas. Talvez isso explique o fato de nunca uma reportagem assinada por mim ter sido questionada na Justiça.
Se lhe puder ser útil em algo mais, conte comigo.
Eliana Simonetti